31 de dezembro de 2020

Retrospectiva Literária 2020


Em anos passados, participei da postagem coletiva Retrospectiva Literária, organizada pelo Pensamento Tangencial, que era sempre uma ótima pedida para fazer o balanço de leituras do ano. Infelizmente, o blog saiu do ar e fiquei enrolando em anos passados de fazer uma lista mais organizada…

Enfim, decidi resgatar a retrospectiva esse ano, porque li muita coisa boa que quero relembrar e recomendar aqui. 2020 foi um ano bem complicado em muitos aspectos, mas eu meio que reencontrei meu ritmo de leituras nesse último semestre. Nunca paro totalmente de ler, mas nos últimos dois anos, manter a leitura constante quase se tornou obrigação em vez de prazer - algo que tem muito a ver com minha meta pessoal de terminar os livros encalhados há anos na estante em vez de pegar o que mais me interessa na hora.

Com todas as dificuldades desse ano, chutei essa minha meta pra lá e fui atrás de livros que me dessem uma sensação de escape. Porque, sério, se tem um ano que merecia escapismo, esse ano foi 2020. Minha prioridade foi ler - ou reler, dei-me esse deleite que sempre adiava para “quando terminar o que ainda não foi” - histórias de esperança, que me trouxessem conforto, que respondessem à profunda necessidade de conexão que o isolamento nos trouxe.

Em março, quando estávamos todos extremamente ansiosos com o início da quarentena, foi o mês que menos consegui avançar, mas outubro compensou com um pequeno recorde - coincidentemente, o mês em que chegou o kindle e virei criança com brinquedo novo. Aliás, esse ano, pela primeira vez desde que comecei a fazer registros de leituras, li mais livros digitais que físicos.

Fiz algumas adaptações na lista da retrospectiva, cortei alguns temas porque deixei de ler alguns gêneros e, de maneira geral, quis focar mais no que foi positivo que nos desgostos do ano, tendo acrescentado algumas posições a lista também. E… é isso. Vamos ao que interessa agora! À Lista!

A aventura que me tirou o fôlego: A duologia (que deveria ser um livro só) Blackout e All Clear da Connie Willis. Parte da série dos Historiadores de Oxford Viajantes do Tempo, traz novos e velhos favoritos (Dunworthy! Colin!), no contexto da Segunda Guerra Mundial, em pleno período da Blitz em Londres.

Há muitas razões para ela nos tirar o fôlego: a tensão de Polly, Michael e Eileen tentando voltar para seu tempo, sem saber o que aconteceu ou porque estão presos no passado; a presença deles em eventos dos quais não deveriam estar nem perto; o constante terror de saber que qualquer ação pode modificar a História como conhecem (fazer Hitler vencer a guerra!) e a própria sensação de que cada dia pode ser o último, com bombas chovendo sobre suas cabeças.


Eu realmente adorei tudo o que já li da Willis e fiquei super feliz esse fim de ano quando ela anunciou que estava escrevendo um novo romance na série dos historiadores. Notícia boa para criar expectativas para o futuro.

O mistério mais enigmático: Começo de pronto dizendo que valeu à pena esperar mais de uma década por um livro novo da Susanna Clarke: Piranesi não simplesmente alcançou minhas expectativas - ele as deixou para trás e me virou de ponta-cabeça no processo. Um mistério filosófico, mundos alternativos e antropologia, a solidão e beleza assombrante da Casa e o método científico do protagonista-narrador… tem tanta coisa nesse livro que simplesmente me mesmerizou que é difícil explicar meus sentimentos quanto a ele. Uma das melhores leituras do ano, sem dúvida.

O romance que me fez suspirar: Tenho uma vaga lembrança de que, quando fiz a última lista dessa retrospectiva, dei-me conta de que não tinha lido nenhum romance naquele ano. Enfim, até que minha lista de agora tem vários romances - e uma lista até diversa, não só composta de romances regenciais (embora eles tenham sido maioria nesta categoria). Enfim, esse ano teve lançamento da Julia Quinn, a série Bridgerton estreando na Netflix (e sim, também aproveitei para reler O Duque e Eu) de forma que é óbvio que ela vai aparecer aqui com First Comes Scandal.

Houve outros romances com que me diverti mais esse ano (vai aparecer ali embaixo), mas a relação confortável de Nicholas e Georgiana, a familiaridade que eles têm desde o início e a forma como eles constroem seu casamento na base de amizade que já tinham é o que realmente me faz suspirar num romance. Eu adoro romances intensos e passionais, não duvidem, mas o que acaba me tocando mais é esse tipo de história mais calma e repleta de bom humor.

A fantasia que me encantou: Se eu tiver que escolher um único título para melhor livro desse ano… eu não conseguiria escolher só um, porque, ao final das contas, tive muitas boas leituras em gêneros diferentes, livros que me deram ou responderam a necessidades diferentes que eu tinha a cada ocasião.

Dito isso, é certo que The House in the Cerulean Sea seria um dos títulos entre os primeiros lugares. Essa fantasia de T. J. Klune não apenas me encantou, mas me confortou e deu esperanças em dias que parecia não haver muitas razões para sair da cama. Um santuário no qual se refugiar nos dias mais dolorosos da quarentena...

A saga que me conquistou: Não tenho lido muitas sagas nos últimos tempos - tenho evitado livros que são parte de séries, especialmente se são séries que ainda estão sendo publicadas. Mas abro exceção para a fascinante construção de mundo de A Passa-Espelhos, série que se inicia em Os Noivos do Inverno.


Estou com o segundo e terceiro volumes aqui para ler - o quarto e último ainda não foi publicado em português, mas já saiu na França. Fiquei muito curiosa para entender mais sobre o mundo de Ophélie.

O clássico que me marcou: Um livro que amei e odiei em tempos alternados, com uma protagonista que detestei e admirei também alternadamente, foi o clássico que mais me marcou esse ano. Estou falando, claro de E o Vento Levou. Caramba, que livro. Acho que nunca tive sentimentos tão contrastantes com uma personagem como tive com a Scarlett.

Talvez por isso ele também ganhe na categoria de leitura mais surpreendente do ano, porque eu nunca sabia o que esperar dos meus próprios sentimentos em relação ao livro a cada nova parte começada. Épico, épico, épico.

A não-ficção que me envolveu: Li muita não-ficção esse ano, gosto do gênero - que, em sendo tão genérico, abarca um mundaréu de coisas -, particularmente quando ele se apresenta na forma de ensaios. Tive um pouco de dificuldades em escolher um único título para esse destaque, mas enfim me decidi pelo magnífico Pandora’s Jar, que explora as sutilezas por trás de figuras femininas dos mitos gregos.

Li esse livro após vê-lo citado numa entrevista do Gaiman e, como de costume, não me arrependo de nada: até hoje todos os livros que li por indicação do autor foram relevantes, apaixonantes, maravilhosos.

O livro que me fez refletir: Nada de novo no front foi o livro mais melancólico que li esse ano - quando, de modo geral, fugi de leituras pesadas como ele. Não me arrependo, contudo: a despeito de nos deixar com um gosto amargo na boca e desânimo na alma, há algo de brutal autenticidade nessas confissões de um homem que viveu toda a falta de sentido da guerra. Não à toa, Nada de novo no front é considerado um dos mais importantes romances pacifistas já escritos - gente como Hitler o odiava e os nazistas queimaram esse livro (entre outros) em praça pública, o que sempre me parece uma excelente razão para se desafiar e ler Remarque.

O livro que me fez rir: Livros que me fizessem rir foi um dos meus paradigmas para esse ano! Pensei em vários para colocar aqui, mas acabei me decidindo por Mythos: as melhores histórias de heróis, deuses e titãs, do Stephen Fry.


Gostei demais do humor do Fry, da forma como ele escolher reapresentar esses mitos, como ele revigorou algo que me era tão familiar que tinha perdido um pouco do brilho original que tinha para mim. Foi uma leitura cativante, em que o clássico conseguiu dialogar com o moderno, em que entendemos como essas histórias tão antigas ainda estão presentes, influem no nosso dia-a-dia.

O livro que me fez chorar: Não precisei nem pestanejar para decidir qual indicar aqui: A Princesinha, de Frances Hodgson Burnett. Embora eu fosse familiar com a história (por causa do filme, que fez parte da minha infância), nunca tinha lido o livro que o inspirou. Chorei, chorei sim, não nego, e foram lágrimas catárticas. Uma daquelas histórias que limpam a alma e aquecem o coração.

Uma releitura necessária: Esse ano eu me permiti várias releituras - há um profundo conforto em se perder nas páginas de uma velha e conhecida história -, de forma que decidi que isso era algo que merecia uma categoria especial na retrospectiva. A dificuldade ficou em decidir apenas uma das muitas releituras que fiz para indicar aqui porque foram vários preferidos a que me apeguei para me refugiar dos dias de quarentena.

No final, meu coração ficou dividido entre dois: Night Watch, o livro favorito da série favorita do autor favorito - uma releitura feita por tradição, bem antes de se pensar em quarentenas; e Os Livros e os Dias, que me presenteou com várias anotações e pensamentos do meu eu de uma década atrás.

O casal perfeito: Então, já falei ali em cima sobre a questão dos romances e, embora eu tenha escolhido algo mais tranquilo pelo que suspirar, o casal do ano pra mim foi intenso, passional, ridículo, hilariante, paradoxalmente doce e mordaz. Estou falando de Alex e Henry de Vermelho, Branco e Sangue Azul, que são, juntos, praticamente todos os tipos de comédia romântica em um único pacote.

Tipo, tem paixão de infância, começam inimigos e se tornam amantes, amizade falsa que se torna verdadeira, amizade colorida, amor proibido, tudo isso embalado num contexto político explosivo, com cartas de amor que se tornam um escândalo nos tablóides, tomadas de posição que extrapolam sentimentos e se transformam em figuras para os livros de História.


Eu dei muita risada lendo esse livro, suspirei sim com as declarações dos dois lados, precisei me abanar nas cenas mais quentes e terminei com a sensação de uma montanha-russa. Há momentos angustiantes nesse livro, mas eles logo são resolvidos. E a forma como os dois protagonistas procuram estar sempre presentes para o outro, como eles superam suas mancadas e cuidam um do outro, como torcem e admiram e respeitam sua contraparte são exatamente ao meu gosto, minha xícara de chá perfeita (em homenagem ao Henry, que, afinal, é um príncipe inglês).

O(a) personagem do ano: Eu pensei em vários para colocar aqui, mas depois de muito me inclinar em uma direção e outra, acabei me decidindo por Piranesi, que dá título ao livro da Clarke. Isso porque embora a Casa seja infinita - ou pelo menos assim imagina o narrador - não se pode negar que Piranesi viva numa prisão, em confinamento, solitário e ansiando faminto por conexões. Como eu poderia escolher outro personagem para representar 2020?

O(a) autor(a) revelação: T. J. Klune, de The House in the Cerulean Sea. Eu terminei o livro e fui atrás de saber o que mais tinha na bibliografia do autor, e quase imediatamente emendei a leitura de The Extraordinaries. Há dois novos títulos dele para serem lançados ano que vem e estou com olho grande em ambos. Eu gostaria de encaixá-lo também em outra categoria criada especialmente para essa minha lista: a de livro que mais quero ver traduzido em 2021, porque assim fica mais fácil eu indicá-lo e presenteá-lo para um monte de gente.

O(a) autor(a) que mais esteve presente entre as minhas leituras: Neil Gaiman ganhou com cinco (quase todos foram releituras), seguido pelo Alberto Manguel e a Connie Willis, empatados com quatro cada um.

O gênero literário que mais li: não-ficção (36,9% do total), seguido bem de perto de fantasia (25,2%). Acho que ano que vem vou começar a registrar os tipos de não-ficção que leio, porque tem de crítica literária a livros de História em várias eras diferentes. Enfim, gosto do contraste das minhas leituras, é razoavelmente diversa em termos de gênero.

O melhor livro que li em 2020: Não consigo responder a questão com um único título; todos os que citei acima caberiam muito bem aqui. Com muita dificuldade, diminuo a lista para três: Piranesi, The House in the Cerulean Sea e Blackout/All Clear (esse último, embora sejam dois livros, são uma única história). Cada um deles foi lido em um momento muito diferente desse ano e todos me ofereceram um refúgio, santuário, e um sentimento de esperança extremamente necessário.


Li em 2020: 111 livros

A minha meta literária para 2021 é: Em anos anteriores coloquei 100 livros (que é mais ou menos minha média anual desde que comecei a registrar isso, usando o Skoob e o Goodreads), mas nos dois últimos anos eu me estressei para completar a lista. Então, em 2020, eu me propus diminuir quase à metade esse número - coloquei 52 no Reading Challenge do Goodreads, um por semana. E aí, para minha surpresa, superei toda minha expectativa e mais que dobrei a meta (há!).

Uma das razões é que deixei de lado a noção de que a prioridade deveriam ser os livros que estavam estacionados na estante. Eu me permiti fazer releituras e ir atrás do que quer que me desse na telha a depender do humor do dia; algo facilitado pela aquisição de um kindle - que aí eu não fico depois tentando brincar de tetris com os livros nas prateleiras em todo canto da casa.

Enfim, tendo deixado um pouco das minhas neuroses, paranóias e planejamentos ambiciosos de lado, as coisas ficaram bem menos estressantes e acabei lendo mais do que a meta. Sendo assim, vou manter os números deste ano. Também continuarei a tentar trazer mais diversidade para o que leio - essa é uma das minhas principais metas para esse ano - e a tentar zerar a quantidade de não lidos na prateleira.

Bem, então… creio que é isso. Retrospectiva pronta. Que venha, agora, 2021!


A Coruja


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