6 de dezembro de 2022
O Natal dos Fantasmas: por uma ceia com histórias de arrepiar
Como eu disse, o fantasma ortodoxo padrão faz sua aparição uma vez por ano, na véspera de Natal, e fica satisfeito.
Por que na véspera de Natal, de todas as noites do ano, é algo que nunca consegui entender. É sempre uma das noites mais sombrias para se estar ao ar livre ― fria, lamacenta e úmida. E, além disso, na época do Natal, todo mundo tem muita coisa para aguentar, com uma casa cheia de parentes vivos, e não quer os fantasmas dos parentes mortos vagando pelo lugar, tenho certeza.
Deve haver algo fantasmagórico no ar no Natal ― algo sobre a atmosfera fechada e mormacenta que atrai os fantasmas, como a umidade das chuvas de verão traz sapos e caracóis.
E não só os próprios fantasmas andam por aí na véspera de Natal, mas as pessoas sempre se sentam e falam deles nessa data. Sempre que cinco ou seis falantes de inglês se reúnem ao redor de uma fogueira na véspera de Natal, eles começam a contar histórias de fantasmas. Nada nos satisfaz mais na véspera de Natal do que ouvir uns aos outros contando anedotas autênticas sobre espectros. É uma época genial e festiva, e amamos pensar em túmulos, cadáveres, assassinatos e sangue.
Sou suspeita para falar dos livros da editora Wish, com sua proposta de resgate de clássicos por vezes completamente desconhecidos no Brasil, promoção de novos artistas e tradutores, e um cuidado com o texto que casa com um histórico de projetos gráficos que são de encher os olhos em cada mínimo detalhe.
Seguindo esse padrão e bebendo na tradição vitoriana dos contos assombrosos para a época natalina, elas lançaram coletânea O Natal dos Fantasmas ano passado, com doze contos reunindo tanto nomes já famosos por aqui - como Dickens, Gaskell, J. M. Barrie e Algernon Blackwood, com outras figuras menos conhecidas do público brasileiro.
As escolhas editoriais dessa coleção foram muito bem pensadas - mesmo os contos que considerei mais medianos ainda conseguiram prender minha atenção e provocar aquele arrepiozinho na espinha. Os dois contos finais, em especial, A Bolsa de Viagem do Blackwood e O prato Crown Derby da Marjorie Bowen, fizeram com que eu me levantasse e fosse dar um passeio pela casa para ter certeza que aquele barulhinho que ouvi era só o vento…
Há humor e lições de moral (bem, são os vitorianos…), crimes de toda natureza, questões de herança e encontros sobrenaturais de passado e presente. Algumas histórias me levaram mentalmente para a calçada da casa da minha avó, ouvindo os contos de trancoso da vizinha contadora de histórias - com um pé no folclórico, na tradição oral, e outro na literatura de gênero, uma cadência própria dos melhores contos de assombro.
[Voltar àquelas imagens de infância, àquela calçada, àquelas noites com um toque próprio de magia, são o maior elogio que posso fazer a esse tipo de narrativa.]
Como presente, para colocar debaixo da árvore esse ano, ou para si mesmo, para entrar o advento com aquele friozinho arrepiante que os vitorianos adoravam para a época, O Natal dos Fantasmas é uma ótima pedida, certeira para terminar bem o ano.
E, em tempo: parece que vai virar tradição a Wish lançar coletâneas especiais de natal. No site deles, estão vendendo já uma nova antologia reunindo apenas autoras mulheres: Contos de Antigos Natais. Vai para a lista do Papai Noel!
Nota:
(de 1 a 5, sendo: 1 – Decepção; 2 – Mais ou Menos; 3 – Interessante; 4 – Recomendo; 5 – Merece Releitura)
Ficha Bibliográfica
Título: O Natal dos Fantasmas
Autor: Vários
Tradução: Regiane Winarski e Adriana Lisboa
Editora: Wish
Ano: 2021
Onde Comprar
Amazon
A Coruja
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Sobre
Livros, viagens, filosofia de botequim e causos da carochinha: o Coruja em Teto de Zinco Quente foi criado para ser um depósito de ideias, opiniões, debates e resmungos sobre a vida, o universo e tudo o mais. Para saber mais, clique aqui.
Nenhum comentário:
Postar um comentário