2 de agosto de 2019

O Mais Longo dos Dias: a história do desembarque na Normandia


"A guerra será ganha ou perdida nessas praias. Teremos só uma chance para interromper o avanço do inimigo, ou seja, o momento em que ele ainda estiver dentro d'água, patinando para chegar à praia. As reservas nunca terão tempo de chegar ao ponto de ataque, e sequer cogitar essa hipótese é uma refinada tolice. A Hauptkampflinie [principal linha de resistência] será aqui. Tudo o que temos deverá ser disposto ao longo dessas margens. Pode acreditar em mim, Lang,as primeiras vinte e quatro horas da invasão serão decisivas... O destino da Alemanha depende desse resultado... Para os Aliados, do mesmo modo que para a Alemanha, será o mais longo dos dias."

Marechal de Campo Erwin Rommel ao seu ajudante de ordens, em 22 de abril de 1944.

Fui atrás de O Mais Longo dos Dias logo após ter chegado de viagem ano passado - quando passei um dia perambulando pela Normandia, seus museus e memoriais da Segunda Guerra. As coisas que vi por lá fizeram com que eu me desse conta de quão pouco eu de fato sabia sobre o que tinha acontecido naquele 06 de junho de 1944. Houvera o desembarque, com dezenas de milhares de baixas dos dois lados e os acontecimentos daquele único dia definiram a Segunda Guerra. Mas o que viera antes? E as histórias pessoais dos que tinham estado lá? Porque, em fatos gerais, indivíduos viram apenas estatísticas, e é difícil você se sentir realmente emocionado só com números.

Talvez por isso eu tenha me impressionado tanto com o que vi por lá e o que li nesse livro: há uma preocupação em preservar as narrativas, as vidas e perdas do dia D (e da guerra como um todo). Estive em Omaha e Juno Beach, passei de ônibus pelos outros setores; visitei os ninhos de metralhadoras em Point du Hoc e o Cemitério Americano. Com a memória muito vívida de enfiar os pés nas areias daquelas praias, minha experiência de leitura de O Mais Longo dos Dias foi - se tenho de escolher um único adjetivo - ensurdecedora. A escolha dos verbos no presente para a narrativa dão uma impressão de imediatismo, de estar no meio da ação. Citações dadas como diálogo, pensamentos pessoais em cenas curtas e vívidas dão tom de romance à História. Ryan mistura relatos de oficiais graduados, soldados rasos e civis franceses (muitos da resistência), concede pequenos vislumbres dos acontecimentos futuros e se baseia em milhares de entrevistas com combatentes de ambos os lados da guerra.


O livro começa no dia 04 de junho, com a apresentação dos atores e a posição de cada um deles. São três partes: “a espera”, “a noite” e “o dia”, e cada uma delas traz uma riqueza de detalhes impressionante. Exemplo clássico de jornalismo literário, Cornelius Ryan consegue aqui unir o interesse humano - os relatos de veteranos que estiveram de fato - com a narrativa militar, os fatos notáveis que se sucederam. Tanto era assim que, a cada página que ia devorando, os reveses, as coincidências e as tragédias que se sucederam me angustiavam, como se o desfecho da história me fosse desconhecido - especialmente quando se percebe o quanto do sucesso da Operação Overlord se deu por pura sorte. Ainda me impressiona como praticamene todo o alto comando nazista da Normandia estava indisponível naquela noite e como demoraram para compreender que sim, o que estava acontecendo ali era, de fato, a invasão aliada e não um exercício para despistá-los.

Entre soldados desembarcando ao som de gaita de foles, paraquedistas sendo arremessados bem longe de seus alvos, oficiais que não se deixavam abater mesmo com pés quebrados, mil e um problemas de comunicação e cálculo; os aliados deram sua cota do dia em sangue (e em humor involuntário, diga-se de passagem…). Ryan consegue ser justo até com os alemães que conseguiram responder naquelas primeiras horas. Ele fez com que eu tivesse simpatia pelos atos de coragem, pela teimosia e pela inteligência de gente como Rommel (lugar errado na hora errada, mas tudo bem…), Priller e seus dois caças contra uma frota de milhares de navios, e o major Pluskat, arrastando-se por entre bases de comando em meio ao bombardeio, insistindo com o comando-geral que não, aquilo não era um ataque diversionista, estava acontecendo sim a invasão.

O Mais Longo dos Dias é um relato épico e muito humano de um dos momentos mais importantes da nossa História. São muitos nomes, muitas ações e muitos detalhes anotados por Ryan, mas a forma como ele estruturou a narrativa consegue prender o leitor, cativá-lo até. Para o volume de informação apresentado, é uma leitura rápida e dinâmica, que merece a classificação de clássico e é uma ótima pedida para entender mais sobre os acontecimentos daquele 06 de junho de 1944.

Nota:
(de 1 a 5, sendo: 1 – Não Gostei; 2 – Mais ou Menos; 3 – Gostei; 4 – Gostei muito; 5 – Excelente)

Ficha Bibliográfica

Título: O Mais Longo dos Dias
Autor: Cornelius Ryan
Tradução: William Lagos
Editora: L&PM
Ano: 2015

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A Coruja


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3 comentários:

  1. Bateu uma baita vontade de ler esse livro agora, depois de ler sua resenha.

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    1. Leia! Eu sou suspeita para falar, porque gosto bastante de livros de História, mas eu realmente me surpreendi com o quanto esse livro me prendeu a atenção, me absorveu e me deixou curiosa em ir atrás de ainda mais informação... O Ryan deve ser um dos pioneiros em jornalismo literário, porque você às vezes se esquece que está lendo um livro de não ficção. E esse ano é perfeito para uma leitura como essa; afinal, agora em junho foi o aniversário de 75 anos do desembarque na Normandia.

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    2. Vou ler sim, já vi até quanto ta pra mais tarde passar na livraria e pegar hahah. Alias eu vi que vai sair uma edição em inglês de aniversario de 75 anos, e ta bonitona aquela edição. Eu já tinha visto esse livro por cima, quando estava procurando os livros do Stephen E. Ambrose, mas não sabia que era tão bom.

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