10 de agosto de 2010

Para ler: The Indigo King



“Nós realmente deveríamos ter algo como um kit do escoteiro,” disse John. “Um tipo de preparado emergencial, para uso apenas em casos de falta de energia, ou terremoto, ou quando um de seus amigos muda a História e faz todas as lojas sumirem.”

“Eu queria ter me lembrado de trazer uma torta,” disse Fred.

“Eu queria ter me lembrado de trazer mais biscoitos,” disse Uncas.

“Eu queria ter me lembrado de trazer o rum,”, disse Jack.


Cheguei à conclusão que o gosto pelas crônicas da Imaginarium Geographica é algo que se adquire de forma gradual. Você começa em Here, There Be Dragons achando a idéia interessante, mas relativamente inocente, sem grandes ‘ohs’ e ‘ahs’. Aí você vai para The Search for the Red Dragon e começa a ler e escorregar até a pontinha da poltrona enquanto segura a respiração esperando a próxima grande revelação, a próxima grande virada. Então você chega no The Indigo King e... caramba, você acaba de se apaixonar perdidamente.

Nesse terceiro livro da saga, cinco anos se passaram desde o último embate no Arquipélago dos Sonhos, quando todas as crianças das ilhas desapareceram, levadas para as Terras do Nunca (que englobam a Ilha de Circe e do Minotauro e são também a inspiração de Dante, que foi um Guardião do atlas, para seu Inferno...). O ano agora é 1931. Charles está na França, pesquisando as catacumbas sob Paris para escrever um livro. Enquanto isso, John e Jack se reúnem em Oxford com Hugo Dyson, o qual eles estão pensando em recrutar como possível aprendiz de Guardião do Imaginarium Geographica.

Assim como John, Jack e Charles, Hugo é um personagem real. Seu nome completo era Henry Victor Dyson Dyson, embora ele preferisse ser conhecido pela primeira alcunha (qual o negócio com essa turma, que referia ser camada por nomes que não eram seus nomes? É a mesma coisa com Jack, nosso C. S. Lewis, cujo nome real era Clive! Vá entender...). Especialista em Shakespeare, era também um membro da sociedade literária dos Inklings e conta Christopher Tolkien que quando seu pai estava fazendo leituras para o grupo de O Senhor dos Anéis, ele ficava “Oh, Deus, não outro elfo!”.

Essa aversão de Dyson por elfos aparece no livro e eu rolei de rir com ele reclamando...

O uso do Dyson nesse livro foi bastante proposital, como explica o próprio ator em suas notas no final. Como talvez vocês já saibam (se não, ficarão sabendo agora), Lewis não era exatamente uma pessoa religiosa – diferentemente de Tolkien, por exemplo, que foi, no final das contas, quem “doutrinou” Lewis e o transformou numa espécie de campeão do cristianismo.

Basta dar uma lida por cima nas Crônicas de Nárnia para se dar conta disso.

O caso é que, nas cartas de Lewis, ele observa que o momento de virada para ele, por assim dizer; quando ele finalmente começou a se convencer dos princípios cristãos, é uma conversa que ele teve com Tolkien e Dyson... Essa menção que Lewis faz em suas cartas foi assim usada por Owens para concatenar a idéia de The Indigo King.

Gostaria de parar um momento para aplaudir de é o senhor Owens por ter feito a lição de casa. Ele pesquisou profundamente para escrever suas histórias e, embora isso seja o mínimo a se esperar de qualquer pessoa que queira escrever, eu tenho visto alguns livros por ai que deixam bastante a desejar nesse aspecto...

Mas, continuemos... John, Jack e Hugo estão por ali caminhando, os dois guardiões tentando resolver um mistério que lhes chegou em mãos: um livro do século quatorze sobre o Santo Graal contendo um aviso para eles e assinado por ninguém mais, ninguém menos que o próprio Hugo, que até então jamais ouvira falar da Imaginarium Geographica.

No meio do caminho, contudo, havia uma porta. Não, sério, eles estão lá caminhando pelo parque e de repente se deparam com uma porta no meio do nada. Mas não qualquer porta: uma porta da Torre do Tempo, que eles conhecem do Arquipélago dos Sonhos, pintada com um símbolo do Graal.

As portas da Torre do Tempo, como descobrimos nos livros anteriores, abrem para diferentes períodos e épocas. No primeiro livro, o Rei do Inverno colocou fogo à torre e, no segundo livro, descobrimos que a torre está se destruindo pouco a pouco, suas portas caindo na Terra do Nunca, criando assim uma espécie de tempestade temporal.

Obviamente, John e Jack ficam bastante surpresos em ver ma daquelas portas ali, em seu mundo. Eles desconfiam que seja uma armadilha. Hugo, porém, acha que toda aquela história é um grande e elaborado truque, uma peça que os amigos estão pregando nele. Assim é que ele passa pela porta, desaparecendo.

E, quase em seguida, Oxford, o parque e tudo o mais some em pleno ar, como se jamais tivesse existido. A perder de vista, tudo o que temos é uma terra desolada, que, não demorarão nossos companheiros a descobrir, é dominada por seu velho inimigo, o Rei do Inverno.

A viagem de Hugo para o passado, através da porta, alterou toda a História. E assim, cabe a John e Jack, com a ajuda de dois texugos falantes e um homem que em quase tudo se parece com seu amigo Charles – mas que não é Charles e atende pela alcunha de Chaz, além de ser um piromaníaco – além do auxílio de Jules (Verne) que aparentemente tudo vê e tudo sabe e, embora morto naquela dimensão histórica, deixou tudo pronto para a chegada deles, reorganizar o passado, de modo a salvar seu presente e futuro.

Para tanto, eles precisam descobrir o verdadeiro nome de Mordred, o Rei do Inverno.

E assim embarcamos por uma viagem pelo tempo e o espaço, começando pela Grécia Antiga, avançando até Alexandria e finalmente, a Bretanha do Rei Artur, aonde irão se misturar descendentes de heróis gregos, a busca pelo verdadeiro Graal, a identidade do Cartógrafo e a história de dois irmãos, gêmeos, exilados do Arquipélago dos Sonhos, desesperados e dispostos a tudo para voltarem.

O livro traz uma série de idéias interessantes, plots que eu adoro (e que estão presentes em muitos dos meus livros favoritos): a idéia de universos infinitos influenciados pelas decisões que tomamos e suas conseqüências; e da diluição dos limites entre bem e mal: “sometimes, good people make bad choices, and vice versa. And that makes it harder to praise – or condemn them”.

Isso é muito verdadeiro, e toma em alguns momentos, proporções extremas dentro da história de The Indigo King, onde um erro de julgamento pode alterar todo o curso da História.

Há uma explicação do Charles, quando escuta a história toda e descobre sobre seu “gêmeo” de outro mundo, Chaz, que trabalha com esses dois temas:

“Eu estou dizendo,” ele retrucou pacientemente, “que há um número infinito de mundos, com um número infinito de cada um de nós neles. Há mundos em que nós nunca nos conhecemos. Há mundos em que nós nunca nos tornamos Guardiões. E há mundos em que nós poderíamos ser homens menores do que somos. É até mesmo possível que as características de um homem num mundo sejam passadas para sua contraparte em outro mundo, e vice versa. Isso talvez explique a habilidade de Chaz de aprender linguagens de forma tão ligeira. Ele não estava aprendendo tanto quanto extraindo das habilidades que eu já possuo.”

“Isso significa que você talvez comece a assimilar os maneirismos de Chaz?” perguntou Jack. “Eu não sei se gosto muito disso.”

“Eu gosto de pensar,” Charles respondeu, “eu tenho esperança, que em todos estes mundos, restaria sempre em cada um de nós o potencial para escolher nos melhorar. E não é saber isso, acreditar nisso, o mais importante?”

Essa noção é a mesma de Interworld, do Gaiman e de Fronteiras do Universo, de Pullman, livros que me fisgaram exatamente por esse debate.

Enfim, dos três livros que li das crônicas até agora, The Indigo King foi, até agora, meu preferido. Agora uma grande, maravilhosa notícia: a Tayla, do Sobre... me fez o grande favor de avisar que a Editora Underworld vai trazer essa série para o Brasil; o primeiro livro está previsto para ser lançado em dezembro.

Recomendo que o peçam de presente de Natal. Como eu já tenho até o quarto livro em inglês, continuarei a coleção assim... e enquanto vocês pedem Here, there be dragons, eu vou pedir The Dragon’s Apprentice, que está previsto para ser lançado em novembro (mamãeeeeeee, eu quero!).

Até lá, eu ainda tenho que ler o quarto livro da saga, The Shadow Dragons. Hum... Será que Verne finalmente vai dar as caras pessoalmente dessa vez?

p.s.: recomendadíssimo olhar o live journal do autor, James Owens. Cara, eu fiquei besta com as ilustrações dele. Vou usar aquele da loja como meu novo desktop!


A Coruja


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