2 de março de 2018

Desafio Corujesco 2018 - Um Livro, Uma Estação || O Conto do Covarde

- Meu nome é Laddy Merridew. Eu sou um chorão. Sinto muito.

– E meu nome é Ianto Jenkins. Sou um covarde. O que é pior.
O tema desse mês para o Desafio Corujesco era ‘um livro, uma estação’. Depois de subir e descer a estante, dei-me conta de que o único livro que eu tinha com o nome de uma estação diretamente no título era Conto de Inverno, que já li e já resenhei aqui no blog (por sinal, tenho que retomar meu projeto Shakespeare…). Contudo, quando estávamos estabelecendo os temas do desafio para esse ano, deixei claro que a estação poderia estar implícita no livro, fosse no título ou na escolha da capa. Assim é que O Conto do Covarde saiu da prateleira para a leitura do desafio.

Não me lembro agora como foi que me interessei por esse livro. Tenho impressão de que o título foi a primeira coisa que me chamou a atenção e algo também na capa - que certamente tem um ar bastante outonal. Ele passou bastante tempo na minha lista de desejados, até aparecer disponível para troca pelo Skoob. Dois anos desde que ele chegou por aqui, o desafio finalmente fez com que eu desse prioridade a ele (o que mais uma vez demonstra porque gosto tanto de cumprir esse tipo de desafio…).

O Conto do Covarde começa com a chegada do jovem Laddy Merridew a uma cidadezinha no interior do País de Gales. Laddy foi enviado para passar uns tempos com a avó, enquanto seus pais passam por um complicado processo de separação. Sentindo-se deslocado naquele novo ambiente e dispensável pelas pessoas que o cercam, Laddy faz amizade com um velho mendigo e contador de histórias, Ianto Passchendaele Jenkins, que pouco a pouco vai revelando as histórias da cidade e seus habitantes, marcados pela tragédia da mina de carvão Gentil Clara.

Os capítulos se sucedem contando histórias independentes, numa narrativa que faz pensar um pouco em As Mil e Uma Noites. O ponto de encontro delas é o narrador, Ianto, e o fato de que todas estão ligadas às perdas e consequências do acidente da mina, duas gerações antes do início do livro. A morte de um avô, de um marido, de filhos e irmãos são os fantasmas que assombram a cidade, ela mesma em decadência, vivendo seus dias de outono. Contar suas histórias é exorcizar esses fantasmas, tentar fazer sentido da tragédia e da dor.

Há algo de universal nas experiências de perda, culpa e trauma que entremeiam o livro. Não é difícil reconhecer nesses personagens pessoas de nossas próprias vidas, identificar ecos de nossas próprias experiências. E, ainda que alguns dos personagens lidem com o luto de formas que nos parecem absurdas… quem somos nós para julgar ou para dizer que não faríamos algo parecido no lugar deles?

Considerando o tema pesado, é surpreendente que a narrativa da autora seja tão leve, tão delicada. Mesmo a mina de carvão tem um nome gracioso: “Gentil Clara”. Eis uma boa pista, pois O Conto do Covarde é um livro melancólico, mas incrivelmente poético. Ianto sabe como contar uma história, como transformar narrativas que poderiam parecer sombrias e até sórdidas em algo de contos de fadas. Há um ritmo em suas palavras - repetições, fórmulas de abertura, palavras que se encadeiam como uma canção - que me fez lembrar da minha infância, de ouvir ‘histórias de trancoso’ na calçada da casa de minha avó.

Cheguei ao final do livro com os olhos marejados mas com a sensação de catarse que costuma acompanhar uma leitura emocional como essa. O Conto do Covarde é uma história sobre perdas, sim, e a culpa dos sobreviventes, mas é também sobre gentileza e solidariedade, sobre verdades pessoais, família e comunidade. Para ficar na memória.

Nota:
(de 1 a 5, sendo: 1 – Não Gostei; 2 – Mais ou Menos; 3 – Gostei; 4 – Gostei muito; 5 – Excelente)

Ficha Bibliográfica

Título: O Conto do Covarde
Autor: Vanessa Gebbie
Tradução: Sibele Menegazzi
Editora: Bertrand Brasil
Ano: 2014

Onde Comprar

Amazon || Cultura || Livraria da Folha


A Coruja


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2 comentários:

  1. Menina, estou atrasada é nos meus comentários aqui rsrsrsrs
    Li três livros para esse tema, porque era uma trilogia com estações do ano nos nomes ;-)
    http://leiturasdelaura.blogspot.com.br/2018/03/child-of-northern-spring-guinevere-1.html
    http://leiturasdelaura.blogspot.com.br/2018/03/queen-of-summer-stars-guinevere-2.html
    https://leiturasdelaura.blogspot.com.br/2018/05/guinevere-legend-in-autumn-guinevere-3.html

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