21 de março de 2013

Projeto Baudelaire: Serraria Baixo-Astral

Caro Leitor,

Para o seu bem, espero que ao escolher este livro você não tenha sido movido pelo desejo de uma leitura agradável. Se seu desejo era esse, aconselho que feche o livro imediatamente, pois, de todos os volumes que contam a vida infeliz dos órfãos Baudelaire, SERRARIA BAIXO-ASTRAL talvez seja o mais triste até agora. Violet, Klaus e Sunny Baudelaire são mandados a Paltryville para trabalhar numa serraria, e ali, lamento informar, deparam-se com coisas terríveis, tais como uma gigantesca pinça mecânica, bifes do tipo sola de sapato, uma hipnotizadora, um horrível acidente que causará ferimentos e um homem com uma nuvem de fumaça no lugar da cabeça.

Prometi escrever a história completa dessas três pobres crianças, mas você não fez nenhuma promessa de lê-la. Portanto, se preferir histórias mais confortadoras, não tenha cerimônia: sinta-se inteiramente livre para fazer outra escolha.

Respeitosamente,
Lemony Snicket.

No quarto volume da desesperançada saga dos irmãos Baudelaire, começamos viajando de trem para Paltryville, onde os órfãos ficarão sob a guarda do Senhor (ele é assim chamado porque ninguém consegue pronunciar seu nome direito), um dos donos da serraria Alto-Astral (oh, ironia...). Parte do ‘trato’ que Senhor impõe às crianças é que elas deverão trabalhar na serraria (esqueça a parte de que isso é um trabalho perigoso) e com isso, ele manterá longe Olaf.

Obviamente, não demora muito para que o Conde apareça, dessa vez disfarçado de ‘Shirley’, a recepcionista da oftalmologista da cidade, Dra. Orwell, que mora em um prédio para além de esquisito em formato de olho (e aí você já sabe que a criatura não pode ser, obviamente, boa bisca).

Seguem-se acidentes, hipnotistas, tentativas de assassinato, lutas de espadas contra dentes (DENTES!) e a já usual série de desventuras a que os Baudelaire são submetidos.

Serraria Baixo-Astral é um dos livros mais sombrios da série e Senhor, uma criatura talvez ainda mais detestável que o próprio Olaf. A forma como ele trata tanto as crianças quanto seus empregados é completamente desumana – o grande problema de Senhor é que ele não é simplesmente ‘mal’, mas sim que ele é amoral. Não importam os custos, contando que haja ganhos. Senhor é a própria personificação do capitalismo selvagem, industrial, e não é à toa que há qualquer coisa que parece identificar o tempo desse específico ponto da história dos Baudelaire com a o período da Revolução Industrial.

Tampouco é coincidência que haja abundantes referências ao clássico 1984, de George Orwell. Não sei se é uma sensação generalizada, mas eu pelo menos li esse volume com algo de sufocante na garganta, a impressão de que existe muito mais nas entrelinhas, nas sombras, nos olhos que vigiam os protagonistas.

É com alívio que você se despede da serraria e de um dos mais odiáveis guardiães das crianças. Agora vamos ver que outras desagradáveis surpresas o futuro guarda para os pobres órfãos Baudelaire...


A Coruja


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