5 de junho de 2012

Desafio Literário 2012: Junho - Viagem no Tempo || Matadouro 5

É curto e confuso e estranho, Sam, porque não há nada inteligente a ser dito sobre um massacre. Teoricamente, todo mundo deve estar morto, para nunca dizer mais nada ou querer mais nada. Teoricamente, tudo deve ficar muito silencioso depois de um massacre, e sempe fica, exceto pelos pássaros.

E o que dizem os pássaros? Tudo o que há para dizer sobre um massacre. Coisas como "
Piu-piu-piu?".
Faz tempo que esse livro está na minha lista de leituras – considerado um dos grandes títulos de ficção científica de todos os tempos, com direito a aliens, explicações sobre a quarta dimensão que possibilitam a viagem no tempo e divagações sobre a guerra, ele faz bem o meu gênero.

Ainda assim, fiquei surpresa com o livro. Ele tem uma narrativa fragmentada, que vai e volta com as constantes idas e vindas de Billy no tempo, ao mesmo tempo metalingüística – porque o autor nos fala em sua própria voz, volta e meia interrompendo a narração da história de Billy para tratar de seu périplo para escrever o livro ou mesmo misturar suas próprias memórias à narração.

De forma alguma isso torna a leitura difícil, a despeito do que algumas pessoas possam dizer. O ritmo de Matadouro 5 é quase o de uma conversa, meio filosofando em botequim – só que embora o tom possa às vezes ser até um tanto burlesco, a essência do livro não é, nem de longe, leviana.

O que ocorre é exatamente o contrário. O retrato que Vonnegut faz da guerra em seu livro é o retrato da estupidez humana, de sua pequenez, do absurdo – o dia-a-dia comum numa situação que nada tem de cotidiana. Curioso é que nunca nos aproximamos da guerra propriamente dita: Billy é um covarde e sendo ele o fio narrativo da história, estamos sempre com ele fugindo.

E tudo isso começou como uma tentativa de escrever sobre o bombardeio de Dresden, cidade sem qualquer importância militar completamente destruída pelos aliados durante a Segunda Guerra por motivos que só nos cabe hoje conjecturar. Calculou-se à época mais de cem mil civis mortos incinerados pelas bombas.

Coisas da vida, como diria o autor.

No final das contas, as classificações impostas a Vonnegut são bem ingênuas. Ele não é apenas um humorista e seu gênero não está restrito nem à ficção científica nem a sátira. Matadouro 5 é maior que rótulos, sem começo ou fim próprios, por vezes uma viagem alucinógena, por outras um inteiro debate filosófico. Você pode lê-lo por muitos motivos, mas seja lá quais forem eles, certamente terminará com mais do que barganhou.

Nota: 5
(de 1 a 5, sendo: 1 – Péssimo; 2 – Ruim; 3 – Regular; 4 – Bom; 5 – Excelente)

Ficha Bibliográfica

Título: Matadouro 5
Autor: Kurt Vonnegut
Tradutor: Cássia Zanon
Editora: L&PM
Ano: 2011
Número de páginas: 224


A Coruja


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6 comentários:

  1. Eu escolhei Matadouro 5 como meu livro do Desafio também, mas ainda estou no início. Ainda estou coma mente em outros livros, então não consegui empolgar na leitura e, confesso, estou morrendo de medo de não dar conta a tempo (todo mês é o mesmo drama, hehehe).

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    1. Ah, mas é um livro curtinho, Mica... e excelente! Quando comecei a ler, nem me dei conta do tempo passando, num instante eu tinha terminado e estava era querendo mais...

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  2. Kurt Vonnegut é foda! Gozado que eu ainda não li "Matadouro 5", e nem "Café da Manhã dos Campeões", que são os mais famosos dele...mas acho que todos os livros dele te deixam com mais do que barganhou, e com uma coceira estranha na alma. "Sereias de Titã" é muito bom também, com uma visão totalmente bizarra sobre o destino da humanidade e o punchline mais demorado e certeiro que já vi na vida. E "Cat's Cradle" é meu favorito, lembrando que eu não li os dois mais famosos ainda, mas me gusta a religião proposta pelo narrador do livro e sua lei principal: "Viva segundo as pequenas inverdades que te fazem corajoso, gentil, saudável e feliz".

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    1. Então que depois de ver essa frase, preciso ler Cat's Cradle! Mas leia Matadouro 5, Enrique, tu vais gostar... Vonnegut é um dos mestres ;)

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  3. Também escolhi esse livro para o Desafio. Penei um pouco até me acostumar com o estilo da narrativa, mas depois fluiu bem. Gostei dos comentários engraçados, como esse do passarinho.
    Estou tentando pela terceira vez ler "O fim da eternidade". Acho que agora vai!
    bjo

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