11 de setembro de 2012

Desafio Literário 2012: Setembro - Mitologia || Cira e o Velho

Diz dona Nhá que andou ao lado de Cira, quando era menina. Ela conta que foi o sangue de virgem dela, de dona Nhá, quando era menina nova, que desfez a magia que prendia a Cira na árvore. A tal da árvore era a mãe dela, transformada… Não é fantástico?
Meio mundo sabe o quanto gosto de mitologia. Conheço um tanto razoável da greco-romana, um pouco de egípcia, pinceladas de nórdica e celta e alguma coisa da japonesa. Do mundo de lendas brasileiras, contudo, confesso que não entendo muito. O que, aliás, acho vergonhoso.

Questão é que a única obra de referência que sei existir sobre o assunto é Câmara Cascudo e, ao menos os livros que tenho ou que já li dele, são obras acadêmicas, não narrativas. Há muito pouco ao alcance do leitor comum – o que sei foi-me ensinado principalmente por Monteiro Lobato (sempre ele!).

Assim é que, quando li a sinopse de Cira e o Velho, senti-me razoavelmente curiosa, curiosidade que só aumentou com a indicação e empolgação da Angélica me falando do livro. Como setembro, no Desafio Literário 2012, era mês de mitologias, lá veio ele para a lista.

Com tudo isso, contudo, eu ainda não sabia o suficiente para criar quaisquer expectativas. Comecei Cira e o Velho com a mente feito uma página em branco. Mas não demorou para que eu ficasse maluca fazendo anotações, cruzando dados históricos e pesquisando o mundo que Walter Tierno construiu.

Cira é filha de uma bruxa, Guaracy, aparentada com as sereias, descendente de alguma antiga e misteriosa civilização que um dia desapareceu; e Cobra Norato – que me faz lembrar um bocado do boto, exceto pela parte em que ele é uma cobra capaz de se transformar em homem.

Cobra Norato tem uma irmã gêmea, Maria Caninana, que é amarga e fria onde o irmão é malandro e charmoso. Tendo assistido ao assassinato da mãe, Maria Caninana faz um acordo com o “Senhor das Mentiras” a fim de conseguir o poder de se vingar – e é no meio desse acordo que entra o bandeirante Domingos Jorge Velho e a desgraça de Cira, que acabará por repetir parte do ciclo da tia, atrás de sua própria vingança.

A história tem constantes turnos, do tipo que sempre te deixam na ponta dos pés sem saber exatamente o que virá a seguir e é uma delícia reconhecer nela episódios da nossa história. A forma como o autor soube costurar fato e mito numa narrativa inteiramente original é, simplesmente magistral.

Ela é violenta, sensual, surpreendente, com um ritmo que quase não te permite deixar o livro de lado (para quem, como eu, não consegue ler em veículos, não se trata realmente de uma escolha...). Uma boa prova de que é perfeitamente possível escrever boa ficção fantástica com elementos nacionais, ao contrário do que acreditam algumas pessoas por aí. Recomendado!

Nota: 5
(de 1 a 5, sendo: 1 – Péssimo; 2 – Ruim; 3 – Regular; 4 – Bom; 5 – Excelente)

Ficha Bibliográfica

Título: Cira e o Velho
Autor: Walter Tierno
Editora: Giz Editorial
Ano: 2010
Número de páginas: 232


A Coruja


____________________________________

 

12 comentários:

  1. Fiquei com vontade de comprar o livro desde que o vi pela primeira vez, porque o nome da minha avó é Cira. Me animei mais ainda depois de ler o post. *.*

    ResponderExcluir
  2. Fico feliz que tenha gostado, e como não sei fazer resenha, gosto de ver as resenhas bem feitas dos livros que gostei e que acho que valem a pena e as suas são sempre muito boas. Bjs.

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Foi um absoluto prazer! Temos gostos literários parecidos, então se tiver mais livros para me indicar, terei o maior prazer em lê-los e também resenhar.

      Excluir
  3. fiquei com vontade de ler, eu também conheço muito pouco de mitologia brazuca! tá na hora de corrigir este erro

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Pois é... é algo que deveria ser mais incentivado, não? Conhecermos mais da nossa própria mitologia, nossa história...

      Excluir
  4. Interessante ver um livro que se baseia na mitologia brasileira. Fiquei bem curiosa para ler, até porque o Cobra Norato e a Maria Caninana aparecem em uma das histórias do livro que estou lendo.

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Opa! Qual o livro que você está lendo, Lígia? Gostaria de ver mais sobre Cobra Norato e Maria Caninana...

      Excluir
    2. É o "Viagem pelo Brasil em 52 histórias", mas a história deles é bem curtinha e não revela muita coisa não...

      Excluir
    3. Hum... Bem, vou dar uma olhada nele depois, de qualquer forma ;)

      Excluir
  5. Oi. Muito obrigado pela resenha e pelos elogios. Fico feliz que tenha gostado do livro. E não posso esquecer de mandar um beijão especial para a Angélica, que sempre indica meu livro (ah, sim... minha sogra "tomou" aquele dicionário que você me mandou, viu Angélica).

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Foi um prazer ler seu livro, Walter. Só tenho a agradecer a Angélica pela indicação ^^

      Excluir

Sobre

Livros, viagens, filosofia de botequim e causos da carochinha: o Coruja em Teto de Zinco Quente foi criado para ser um depósito de ideias, opiniões, debates e resmungos sobre a vida, o universo e tudo o mais. Para saber mais, clique aqui.

Cadastre seu email e receba a newsletter do blog

powered by TinyLetter

facebook

Arquivo do blog