27 de outubro de 2022

A Vertigem das Listas: Dez Grandes Estadistas


Lulu: Como estamos esse mês em período de eleições, decidi celebrar esse evento cívico em que exercemos mais que nunca nossa cidadania com um vertigem que traz Dez Grandes Estadistas.

Eu poderia passar algumas horas aqui tratando do que é ser um estadista, sobre cidadania e democracia (o que é um tanto irônico a se considerar que nem todos os estadistas da minha lista são exatamente o que se chamaria de democratas…), mas acho que isso fará mais sentido nas explicações das escolhas.

Sem maiores delongas… vamos a eles!

1. Começo pela Grécia Antiga, com Péricles, célebre estadista e general ateniense, que governou a cidade-estado precisamente durante sua Era de Ouro. Atenas floresceu sob seu comando, tanto na política - encorajando a participação dos cidadãos nos debates públicos -, quanto nas artes e na literatura. O complexo arquitetônico da Acrópole, que incluiu o Partenon, foi obra de seu governo. Minha fascinação pessoal com Péricles começou da infância, o que pode parecer uma afirmação estranha, mas não é: ele, seus contemporâneos e a transformação ateniense aparecem em um dos volumes do Sítio do Pica Pau Amarelo, e a admiração de Dona Benta me conquistou. Péricles para cima deles!

2. Não sei explicar exatamente como exatamente me tornei fangirl de Napoleão Bonaparte. Sejamos sinceros, o imperador francês não era lá uma boa pessoa. Mas foi um comandante militar genial e carismático, determinado o suficiente para ascender de origens relativamente modestas para o homem mais poderoso (e odiado) do mundo. Desconfio que parte da razão para a figura dele ter chamado minha atenção foi a leitura de O Príncipe com seus comentários informais que dialogam diretamente (por vezes hilariantemente) com o texto de Maquiavel.

Napoleão conseguiu centralizar o poder na França, após os momentos mais dramáticos e sanguinolentos da Revolução Francesa; promoveu reformas importantes - agrária, tributária, educacional -, criou o Banco da França, estabelecendo o franco como padrão monetário e investindo na indústria do país e, talvez sua contribuição mais duradoura: outorgou o Código Civil Napoleônico, que em boa parte continua em vigor e influenciou a organização de outros códigos legais em todo o mundo.

Ambicioso? Sem dúvida. Mas, uma vez no poder, Napoleão de fato fez a diferença com suas decisões.

3. Churchill é um caso de o homem certo para um trabalho em específico. Em suma: é difícil imaginar com as coisas teriam ocorrido na Segunda Guerra Mundial se não houvesse Churchill como pedra no sapato de Hitler no meio do caminho. Churchill teve coragem de denunciar as posições de Chamberlain e do governo britânico que deram espaço para a escalada nazista - mesmo quando ele era uma voz absolutamente solitária no Parlamento, visto como um alarmista, talvez saudoso do trauma da Primeira Guerra.

Para além da capacidade estratégica, experiência de combate e realismo sobre os conflitos que se avizinhavam em sua época, Churchill tinha uma extraordinária capacidade oratória e não há dúvida que seus discursos inspiraram a fleuma com que os britânicos reagiram a Blitz e outros revezes. Não à toa, ele recebeu um nobel literário; Churchill definitivamente entendia do uso da palavra nos livros e na política.

4. Já fui da Grécia, França e Inglaterra e da Idade Antiga para Era Moderna, então agora é hora de puxar uma sardinha para o Brasil. Eu cresci ouvindo falar do nome de Ulysses Guimarães, sempre com respeito e admiração. Eu tinha seis anos de idade quando aconteceu o acidente de helicóptero, mas me lembro de chorar como se tivesse perdido uma pessoa da família.

Ele foi um dos principais opositores da ditadura militar (embora ele tenha apoiado o golpe de início), tendo liderado campanhas pela redemocratização, posteriormente presidindo a Assembleia Constituinte. O principal plenário da Câmara dos Deputados leva seu nome (embora eu tenha dúvidas se isso conta realmente como homenagem… mas, bem, vão-se os mandatários, fica a instituição?).

5. Saindo da História para a ficção… eu não poderia deixar de terminar essa lista com Lorde Vetinari, o patrício de Ankh-Morpork na série Discworld, e que, propositalmente, encarna todas as características do Príncipe idealizado por Maquiavel. Vetinari é a síntese do maquiavelismo no mais puro sentido do termo, pragmático em todos os sentidos.

Sempre achei interessante que Vetinari - pertencente a nobreza desde sempre, e cuja formação é a Guilda dos Assassinos - é um ascético cujo interesse maior é, de fato, a Coisa Pública. Ele não parece fazer nada por particular ambição ou sede de poder, mas sim porque ele acredita na necessidade de engrenagens e um certo tipo de ordem (bem, é Ankh-Morpork, ordem é algo… peculiar para o cotidiano social dela…). Vetinari - junto com Vimes - são bastiões que, embora bastante pessimistas sobre a natureza da humanidade, acreditam com todas as forças na obrigações e deveres que têm em seus respectivos cargos. Os romances em que os dois trabalham juntos (ou em choque) estão entre os melhores da série.


Ísis: Bem que a Lu disse que queria se vingar do tema anterior… Quando vi esse, pensei que só podia ser vingança porque ela sabe que eu não sou boa de história, especialmente nomes e datas. Só que ao final das contas o difícil foi escolher só cinco, porque depois de assistir dramas chineses históricos e ouvir Blinks sobre diferentes temas, inclusive sobre líderes, enquanto faço esteira, fiquei foi com excesso de opções…

6. Acabávamos de viver as comemorações ao jubileu de platina da Rainha Elizabete II, quando escrevi esse vertigem. Ela já era oficialmente a monarca britânica de maior reinado, e acho que também de quase rosa a Europa, né, Lu? Ela não é ainda a(o) monarca de reinado mais longo na história, mas estava quase lá (vide: https://en.wikipedia.org/wiki/List_of_longest-reigning_monarchs#cite_ref-16). Tristemente, morreu mês passado (setembro de 2022), e eu admito que chorei várias vezes, apesar de nunca ter tido qualquer ligação com ela. Seu reinado foi um de paz e prosperidade, algo que acredito já fica bom no CV de qualquer líder de estado, e ela fazia isso sendo o mais neutra possível em assuntos políticos, coisa difícil de se conseguir no dia a dia, imagina ao longo de SETENTA anos de reinado? Deus salve a Rainha.

7. Também aproveitando o momento, mas dessa vez um acontecimento triste, citarei Putin. A guerra na Ucrânia, por pior que sejam os crimes lá cometidos pelo exército russo, já é uma consequência de décadas de política anti-Rússia (anti-soviética, mesmo após a Guerra Fria), e Putin está respondendo às ameaças às suas fronteiras… De uma forma covarde e desleal, mas provocada, embora não pelos ucranianos. Assim, creio que a grandeza de Putin enquanto estadista encontrava-se no início de seu “mandato” e não mais agora, mas preciso admitir que retirar um país da fome é um grande feito. O presidente russo não é flor que se cheire - para não dizer pior - mas, qualquer que seja a opinião acerca dele, não se pode negar sua importância à recuperação da Rússia pós-Guerra Fria. O país estava caminhando para a miséria, e foi em grande parte (mas não somente) graças aos esforços de Putin que o maior país do mundo pôde se reerguer. Essa melhora econômica, porém, veio a um certo custo, e dependendo do ponto de vista, especificamente o nosso no ocidente, esse preço foi a democracia.

8. Morando quase uma década em Nagoya, preciso citar Ieyasu Tokugawa um dos três grandes samurais da milenar história do Japão. Pela época das grandes navegações dos poderes europeus, o arquipélago japonês estava dividido em inúmeros estados pequenos, e muitos em conflitos entre si. Os três grandes samurais destacam-se por seus esforços em unificar esses pequenos estados, mas foi somente Ieyasu Tokugawa quem conseguiu durante a segunda metade do século XVI. A família Tokugawa é oriunda de um dos estados que deu origem à província de Aichi, de onde Nagoya é a capital. Foi Tokugawa quem mandou construir, por exemplo, o castelo de Nagoya e parece que o castelo de Edo (Tóquio) também. Foi ele quem venceu a batalha de Sekigahara, uma das batalhas feudais mais importantes (e acho que de maior número de mortes também). Dizem que Ieyasu participou direta e indiretamente em quase 100 batalhas, coisa que somente essa época bélica permitia. Era paciente e audaz, um grande líder. Sabia ser leal, mas também podia ser vingativo e trocar de lados para vencer as batalhas. Foi implacável na perseguição dos Toyotomis após a morte de seu aliado Hideyoshi Toyotomi, a quem sucedeu como líder. A província de Aichi é cheia de lembranças desse(s) samurai(s), desde o jardim Tokugawa (lindo no outono!!!), passando pelo Museu Tokugawa… Até mesmo o desfile de Nagoya em outubro sempre tem um Ieyasu Tokugawa, e é o personagem mais seguido, pelo que percebi. Foi ele quem fechou o Japão, permitindo somente que a Companhia das Índias Holandesa continuasse a ter relações comerciais no território. Também foi ele o grande responsável pela expulsão dos cristãos, inclusos os jesuítas, temendo uma invasão do território japonês pela Espanha ou Portugal (na época eram um só, a União Ibérica).

9. Eu sou apaixonada por Dom Pedro II desde que meus pais levaram meu irmão e eu para conhecer o palácio em Petrópolis e depois nos deram um pequeno livro sobre o monarca. A recém exibida novela “Nos Tempos do Imperador” deixou-me ainda mais apaixonada por ele, pois imagino o quanto é horrível nascer para suportar um fardo enorme como é o de um monarca sério e dedicado, e então passar a infância e a juventude preparando-se para reinar, estar disposto a realmente governar para o povo, mas ter de enfrentar as críticas e interesses daquele que protegem apenas os próprios interesses numa época em que ainda havia escravidão e poucos direitos. Dom Pedro II foi responsável por muitas das inovações tecnológicas que mudaram o Brasil, que foi um dos primeiros países a ter linhas telefônicas graças a ele, além de obras como barragens (hoje podemos criticar os efeitos ambientais, mas na época eram essenciais), faculdades e universidades etc. Ele sofreu muito, especialmente ao fim da vida, e espero sinceramente que sua encarnação seguinte tenha sido menos dolorosa. Ainda assim, foi um dos monarcas que mais reinou em todo o mundo, e creio que isso não seria possível se não fosse tão dedicado ao ofício…

10. Esse último foi difícil. Não sabia quem escolher… Resolvi indicar Lee Kwan Yew, o primeiro líder da Cingapura, salvo engano. Ultimamente, enquanto sofro de manhã na esteira, ou eu assisto a um seriado que já tenha visto antes, ou utilizo o aplicativo Blinkist para "folhear" auditivamente livros que pareçam interessantes. Um dos que ouvi foi Leadership, do Henry Kissinger. Nesse livro, o ex-secretário de Estado dos EUA fala de alguns líderes mundiais, dentre eles este que transformou a ilha de Cingapura na potência econômica que é hoje. Passando por problemas como as grandes diferenças raciais que formavam a população que vivia na ilha recém independente, Lee Kwan Yew evitou grandes revoltas e conflitos como aqueles que vemos acontecer em vários outros países, e fê-lo sendo brilhante e objetivo, pois sabia que a ilha não seria independente por muito tempo de outra forma... Ele e seu partido elaboraram leis para perseguir e reduzir significativamente a corrupção, criando uma identidade nacional que superasse as diferenças de raças e classes existentes, e dedicou o impressionante rateio de UM TERÇO do PIB do país em educação… e foi uma educação ao bilíngue: inglês e qualquer que fosse a língua materna da pessoa.

Nunca fui à Cingapura, não sei dizer o quão bem funciona o país atualmente, mas acho que todos nós já devemos ter ouvido algo sobre o lugar. O resultado das políticas de Lee Kwan Yew foi uma nação que é avançadíssima, apesar do pouco espaço de que dispõe. Acho que é um excelente exemplo de que não precisa de expansão territorial (alô, Putin??) nem conflitos para se erguer uma nação… basta harmonia e educação. Quem quer que ganhe nessas eleições presidenciais (2022), espero que leia sobre o caso e se inspire…. " #SouBrasil


Lulu: Eu fiquei achando que você tinha escrito o nome do país errado... mas aí fui pesquisar e aparentemente tanto a grafia Singapura quanto Cingapura são consideradas corretas... Enfim...

Para um tema que parecia bem complexo a princípio, até que a gente se saiu bem, não é?

Enfim, final de semana que vem tem o segundo turno. Votem com consciência e… bem, apertem os cintos, porque, independentemente de resultados, as próximas semanas provavelmente serão bem turbulentas…


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