30 de dezembro de 2020
Conversas Sobre o Tempo: O Último a Sair Apaga a Luz
Depois de amanhã iniciamos uma nova década, a de 20 - pergunto-me se, estando fadados a repetir o passado no presente, isso significa que teremos um revival dos roaring twenties, com toda a sua efervescência cultural - e assim, finalmente nos despedimos desse ano tão conturbado que foi 2020.
Desde março que estou trabalhando de casa. De certa maneira, manter minha rotina de horários ajudou a não perder a sanidade mental - ainda que minha rotina tenha começado a incluir dias em que trabalho de pijama. Na verdade, no começo da quarentena, eu organizei mais ou menos um cronograma de atividades (olá, Lulu neurótica), incluindo tempo para alguma atividade física, e isso ajudou um bocado.
Vi muita gente reclamando de ganhar peso nesse período. Eu perdi. Três razões: primeira, estar em casa significa que meus lanches estão mais saudáveis; passei a comer mais fruta ao longo do dia. Segundo, para lidar com a insônia no fim da tarde sempre dou umas voltas em torno do condomínio (seis voltas são cinco quilômetros e uma noite de sono bem dormida). Terceiro, minha ansiedade se manifesta em crises de náusea intensa (e a maldita insônia), que, combinado com um agravamento da minha intolerância à lactose, fizeram de agosto um mês dos infernos.
E, bem, foram tantas as razões para ansiedade esse ano - quantas vezes tive de desligar o noticiário e ir para a janela, respirar fundo tentando não esbravejar para o vazio? - que me surpreendo de chegar ao final dele razoavelmente calma. Entre tios, primos e parentes por afinidade, muita gente adoeceu e tivemos várias perdas - incluindo uma das irmãs mais velhas da mãe, e das tias mais queridas e divertidas. Meu irmão, que no auge da crise estava trabalhando dentro de um covidário, não ficou doente (pelo menos, ele nos diz que não), mas fato é que, até Felipe estar vacinado, continuamos de coração na mão.
Na verdade, até o último instante, 2020 não nos deu trégua. Meu padrinho foi internado logo após o natal. Está bem, estável, só precisando tomar oxigênio. Mas o susto - em cima de todos os outros que aconteceram ao longo dos meses passados - foi grande.
Meu principal consolo nesses tempos foi que meus pais estavam em casa comigo. E que tivemos muito tempo para estarmos juntos - para compartilhar maratonas de séries com o pai e rezar novenas com a mãe (há um estranho conforto na repetição de rituais). Coisas que em tempos normais talvez não tivéssemos feito, cada um no seu quadrado, vidrado em sua própria tela.
Se bem que, deve-se dizer, as telas e telinhas foram nossa salvação esse ano, permitindo que continuássemos conectados com parentes, amigos, entes queridos. O fato de estarmos distantes não significa que nos fizemos ausentes.
Os livros também foram uma fonte de conforto - e um santuário -: foram várias releituras e uma maior procura por finais felizes. Como bem disse Lewis, parafraseando Tolkien, quem costuma se preocupar com fugas são carcereiros; e o escapismo de se perder entre as páginas de uma boa história não significa que elas não possam nos render bons momentos de reflexão e empatia, para além de entretenimento (mas o puro entretenimento também é válido!).
Dito tudo isso… que venha 2021. Venha com mais paz, mais saúde, mais solidariedade, mais tolerância, mais verdade, mais ciência, mais responsabilidade, mais esperança, com a possibilidade de reencontros, de abraços, de uma boa farra. Amanhã ainda tem a retrospectiva literária. De resto… até ano que vem, pessoal!
A Coruja
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