23 de fevereiro de 2016

Gazeta de Longbourn: Razão e Sentimento

"E afinal Marianne, por mais fascinante que seja a ideia de um único e constante amor e apesar de tudo o que se possa dizer sobre a felicidade de alguém depender completamente de uma pessoa determinada, as coisas não devem ser assim, nem é adequado ou possível que seja"
Primeiro romance publicado por Jane Austen, Razão e Sentimento traz como protagonistas duas irmãs que são a personificação do título: Elinor, a mais velha, que serve de esteio à família, contida e racional e Marianne, impulsiva, romântica e intensa em todas as suas emoções.

A história começa com grandes perdas: a perda do Sr. Dashwood, pai das meninas, de Norland Park, a casa em que moraram por tantos anos e que lhes era tão cara, e de seus próprios meios de subsistência – as últimas duas em função do egoísmo intrínseco de seu meio-irmão, que tudo herdou por força de um testamento do tio-avô, e da esposa do mesmo.

Forçadas pelos acontecimentos, a família acaba por se mudar para um chalé oferecido por um primo da Sra. Dashwood, onde se desenvolverão seus relacionamentos com o charmoso Willoughby, o tímido Edward Ferrars e o nobre Coronel Brandon.

Razão e Sentimento nos apresenta muito das nuances sociais do século XIX –família e de dinheiro estão no centro do enredo, talvez até mais que os romances que as irmãs vivem. É um interessante estudo do contexto histórico: das convenções sociais que prendem as mulheres Dashwood, do poder exercido pela Sra. Ferrars sobre os filhos, ao trágico passado de Brandon... todas essas relações estão intimamente associadas com questões financeiras.

Talvez por isso consideremos Razão e Sentimento um ‘romance burguês’ ou de classe média. Há uma constante preocupação com classe e hierarquia social, mas essa preocupação não deriva de títulos de nobreza e direitos de nascimento, fundamentando-se, sim, naqueles que detém o poder econômico.

Isso destaca Austen de outros autores do período e é um dos muitos motivos pelos quais, embora vivendo no primeiro grande ciclo do Romantismo, sua escrita tenha uma forte tendência ao Realismo, movimento que floresceria quase um século após sua morte.

Se, por um lado, o entrevero financeiro das Dashwood possa nos parecer estranho nos dias de hoje – considerando que se esta fosse uma história em tempos modernos, elas poderiam trabalhar, ao passo que essa opção não lhes é facultada na sociedade do século XIX – há muito com que podemos nos identificar no livro.

Mais que qualquer relacionamento romântico, contudo, o realmente move o livro é a união entre as duas irmãs. Elas são personagens extremamente reais e o conflito que representam entre lógica e emoção é algo com que podemos nos identificar independente de época.

Num primeiro momento, Austen pode parecer estar interessada em apresentar dois caminhos diferentes, com apenas um correto (e não é difícil interpretar qual deles seria o certo, considerando o quanto Marianne sofre ao longo de toda a história para conseguir aprender alguma coisa). Creio, contudo, que o verdadeiro objetivo do livro é apresentar uma terceira opção.

A natureza passional de Marianne quase a leva à morte, mas o pragmatismo e estoicismo de Elinor também lhe causam imensa dor. É necessário que ambas encontrem um ponto de equilíbrio: Marianne tem de aprender a não se deixar levar impulsivamente por suas emoções, ao passo que Elinor precisa se dar conta que se reprimir tanto acabará levando-a a um esgotamento nervoso.

Lógica e emoção não são mutuamente excludentes e é apenas quando as irmãs encontram o equilíbrio entre os dois que podem, também, encontrar sua felicidade.

Nota:
(de 1 a 5, sendo: 1 – Não Gostei; 2 – Mais ou Menos; 3 – Gostei; 4 – Gostei muito; 5 – Excelente)

Ficha Bibliográfica

Título: Razão e Sentimento
Autor: Jane Austen
Tradução: Ivo Barroso
Ilustrações: Hugh Thomson
Editora: Nova Fronteira
Ano: 2012

Onde Comprar

Amazon || Cultura || Saraiva


A Coruja


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