17 de setembro de 2015

360º: Você já foi à Bahia?


Embora uma vez tendo decidido fazer essa viagem, montes de planejamento neurótico se seguiram, a verdade é que a decisão de ir conhecer Salvador esse ano foi meio impulsiva. Vivo tentando convencer D. Mãe e o Senhor Meu Pai a viajar, sair de casa, se distrair um pouco – normalmente sem grandes resultados. Aí apareceu uma promoção de passagens, tinha umas com preço muito bom para Salvador na época do feriadão da independência e D. Mãe observou que não conhecia a cidade. Resumo da ópera: comprei as passagens para todo mundo disse que ia ser o presente do dia dos pais e não aceitamos devoluções!

Já tinha dado um passeio pela cidade ano passado, quando fiz uma escala de quase um dia a caminho de Londres. A Flávia, querida como só ela podia ser, passou o dia comigo na ocasião, mas a gente só teve tempo de descer do carro para subir no Elevador Lacerda e dar uma olhada na cidade lá de cima. Dessa vez, com um pouco mais de tempo, poderíamos conhecer as coisas com mais vagar.

Chegamos na quinta no final da tarde e não deu para ver muita coisa – até porque eu cheguei completamente zonza e ligeiramente enjoada (normalmente tomo um dramin antes mesmo de colocar o pé para dentro do avião, mas como era uma viagem curta, acabei esquecendo o remédio e paguei o pato...). Mas a sexta amanheceu com céu claro e do hotel tivemos nossa primeira vista da praia da Barra.

Igreja de Santo Antônio da Barra, construída em 1560 e que podíamos ver do mirante do hotel
Tínhamos combinado, nesse primeiro dia, de encontrar a Flávia e a mãe dela para passearmos, então acordamos cedo, tomamos café e demos um passeio rápido pela orla para ter uma idéia de nossa localização. Não muito longe do nosso hotel, dava para ver o Forte de Santa Maria – que começou a ser construído em 1614 no local de desembarque do primeiro Governador-Geral do Brasil, Tomé de Sousa, em 1549; bem como da primeira invasão holandesa em 1624 – e o Farol da Barra, que é um dos principais cartões postais de Salvador.


A caminhada foi breve, mas serviu para fazer a digestão (porque o café da manhã foi de uma fartura que nos fez comer com os olhos) e logo estávamos de volta para começar nosso verdadeiro passeio. E a primeira parada foi a antiga Praça da Sé, onde nos deparamos com o monumento da Cruz Caída.

Minha guia para o dia!

A antiga catedral da Sé, que começou a ser construída 1553 e seria a mais antiga catedral do país, foi demolida em 1933 para dar espaço à circulação de bondes que deixaram de passar por ali em 1982. Em outras palavras, destruíram 380 anos de história por um suposto progresso que não chegou a durar meio século...

Marcando esse triste acontecimento, está a escultura de Mário Cravo, a Cruz Caída, encomendada pela prefeitura da cidade para marcar os 450 anos de Salvador.

A fantástica vista do Belvedere da Sé

A Praça da Sé também tem estátuas homenageando Tomé de Souza, Zumbi dos Palmares e minha particular favorita, D. Pedro Fernandes Sardinha, primeiro bispo brasileiro e o primeiro sushi da história (ok, essa foi uma piada cretina...)


Para quem esqueceu as aulas de história, D. Fernandes Sardinha foi o primeiro bispo do Brasil, capturado por índios antropofágicos que o mataram e devoraram...

Da Sé, saímos andando, observando a arquitetura, conversando e trocando anedotas, até chegar à Igreja da Ordem Terceira de São Francisco.

A Igreja e Convento de São Francisco, que é vizinha a essa Igreja, é mais conhecida (e falaremos dela depois) e, por consequência, muita gente parece passar batido pela visitação dela. Mas é um lugar interessante: trata-se de uma igreja administrada pela ordem dos leigos (por isso terceira ordem, sendo a primeira dos padres e a segunda das freiras), que começou a ser construída em 1702. Sua fachada é típica do movimento barroco e lembrou-me um pouco o Mosteiro dos Jerônimos em Lisboa.


Os azulejos portugueses e os santos com cabelos humanos fizeram-me pensar também na Capela Dourada aqui no Recife...


A Igreja em si é muito interessante, especialmente pelas pinturas do teto em perspectiva, mas o que mais gostei foi, claro, o trono usado por nossos monarcas dos tempos de colônia e império.

Como eu não podia me sentar, a Kolory apareceu para fazer as honras!



Uma das histórias interessantes que ouvi sobre a Igreja foi a proibição de enterrar gente dentro do átrio em função de epidemias constantes – o que gerou uma revolta do povo rico da cidade (que era quem tinha dinheiro para pagar e ser enterrado lá dentro), que acabaram contratando gente para destruir os cemitérios construídos!

Para resolver a situação, foi encontrado um meio termo: povo era enterrado no cemitério, após dois anos quando só restavam os ossos, eles poderiam ser transferidos para o ossuário da Igreja.

Esse deve ser um lugar legal para se visitar à noite...

Esse foi um passeio extenso, e o terminamos já no final da manhã, quando saímos para almoçar... o resto do dia foi passado conversando, comendo e conhecendo a cidade de carro – passamos pela Lagoa de Abaeté, com suas águas negras e areia branquíssima; a praia de Itapoã, o clube espanhol...

Não tirei tantas fotos dessa etapa, mas posso dizer que valeu cada minuto – não apenas pelo fato de termos podido ver um pouco da cidade pela ótica de ‘nativos’ (felizmente não antropofágicos), mas principalmente pela companhia. Só tenho a agradecer pelo dia maravilhoso que passei com eles.

Para o dia seguinte tínhamos contratado uma excursão para fazer o city tour e histórico, afinal, não dava para ficar alugando os amigos indefinidamente, não é verdade?

Começamos visitando o Farol da Barra, onde hoje funciona o Museu Náutico da Bahia. Foi o primeiro do Brasil, inaugurado em 1698 – o forte em si, que começou a ser erguido em 1536, é anterior à construção da própria Salvador.

A vista de lá da baía de todos os santos chega a arrepiar de tão linda...


Do farol, fomos para o elevador Lacerda e dali seguimos para o Pelourinho, parando pelo caminho para tirar fotos com baianas, ouvir anedotas do guia, admirar a arquitetura e comer cocada.

Olhando de baixo
Olhando de cima

Posso dizer que olho para essas eiras e beiras e tribeiras dos sobrados no Pelourinho e penso "dava para fazerem um Assassin's Creed aqui"?



Chegando ao Pelourinho, a primeira coisa que nos chamou a atenção, claro, foi um grupo batucando - alunos do Olodum, segundo nos disseram. E a imagem do Michael Jackson na sacada, lembrando que quando ele gravou um clipe com o grupo, naquele mesmo local.



Ali juntinho fica também a Igreja de Nossa Senhora do Rosário dos Pretos, que teve sua construção começada em 1704 e finalizada em 1796, nascida da devoção de escravos e negros forros. É famosa pela missa sincrética, onde os ritos católicos são feito ao som dos atabaques africanos. Levou quase um século para ser terminada porque foi erguida pelos membros da Irmandade de Nossa Senhora dos Homens Pretos do Pelourinho - muitos dos quais escravos, que só podiam trabalhar na construção quando eram liberados por seus patrões.


Do Pelourinho seguimos afinal para a Igreja e Convento de São Francisco.


Essa Igreja é considerada a sétima maravilha de origem portuguesa do mundo - e é também conhecida como 'caverna dourada'. Não é preciso ser um gênio para descobrir o porquê disso, não é mesmo?



A igreja atual começou a ser construída em 1686 - a original foi destruída quando da invasão holandesa - e além dos altares barrocos recobertos de ouro, um de seus destaques é o conjunto de painéis de azulejo português no claustro, contando, entre outras cenas, a história de São Francisco. O conjunto arquitetônico, de uma forma geral, lembrou-me muito a Capela Dourada cá no Recife, que também é da ordem franciscana (cá entre nós, a quantidade de ouro nesses lugares não é muito condizente com a história de Francisco, mas...).



Saindo do Pelourinho, descemos junto da Arena Fonte Nova - construída para os jogos da Copa do Mundo - e do dique do Tororó, particularmente famoso pelas estátuas dos orixás. O engraçado é que eu conhecia o nome Tororó, mas não sabia que fazia referência a esse lugar: quem aqui não ouviu na infância "eu fui a Tororó ber água e não achei; encontrei linda morena que no Tororó deixei..."?


Eis então que chegamos a outro dos mais icônicos pontos turísticos de Salvador: A Igreja de Nosso Senhor do Bonfim. A tradição das fitinhas do Bonfim é originalmente dessa igreja, que foi construída entre 1746 e 1754 para abrigar a imagem do Senhor Bom Jesus do Bonfim, trazida de Lisboa pelo capitão-de-mar-e-guerra da marinha portuguesa, Theodózio Rodrigues de Faria, em função de uma promessa. É aqui que ocorre a famosa lavagem das escadarias na festa do Senhor do Bonfim, no segundo domingo de janeiro.


Saindo do Bonfim, fomos para o Mercado Modelo, comer mais cocada (há!). Sério, eu adoro cocadas e as do mercado estavam particularmente deliciosas...

O Mercado Modelo foi inaugurado em 1912 e servia como centro de abastecimento e distribuição da cidade. Destruído e reconstruído diversas vezes ao longo da história por inúmeros incêndios - o último em 1984. Há um subsolo onde eram armazenados vinhos e outras mercadorias que necessitassem de refrigeração. Contam os entendidos de assuntos de assombração que esses túneis são anteriores à construção do mercado e era onde os escravos recém-chegados eram armazenados antes de serem vendidos. Por isso, se você estiver por ali de noite, após o fechamento do mercado, pode ouvir os grilhões e correntes deles.

Mas, cá entre nós, o que eu mais gostei no mercado foi a vista que ele proporcionou do pôr do sol...


Voltando para o hotel, terminamos de assistir o pôr do sol na praia da barra...


...e tivemos a agradável surpresa de encontrar uma banda tocando MPB no ponto de ônibus - a rua fora fechada para tráfego e estava todo mundo por aí, cantando, dançando, bebendo, comendo e se divertindo.


Minhas impressões finais sobre Salvador: é uma cidade repleta de cartões postais e História e eu certamente voltaria para visitá-la (eu só passei pela frente dos museus, quero entrar neles também!). Tem havido um esforço em revitalizar as áreas de interesse turístico: tudo parece estar em reforma, mas se percebe que as coisas estão caminhando bem. Há ônibus especiais que passam pelas regiões de hotéis e levam para os principais pontos turísticos, o que facilita MUITO a vida do turista.

Fiquei impressionada com a quantidade de polícia e postos policiais, embora pelo que me falaram, eles se concentram mais na área onde ficam os turistas. Seja como for, andamos pela cidade tranquilos, até saindo de noite para ir a supermercado e padaria próximos ao hotel, a despeito dos alertas do meu irmão, que ficou em casa aparentemente lendo Capitães da Areia e ligava todo dia para saber se ainda estávamos vivos.

Pois é...


Foi um ótimo passeio. Pena que terminou tão rápido... mas dezembro tem mais: próxima parada vai ser São Paulo e a Comic Con Experience! Aguardem a farra ;)


A Coruja


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