9 de fevereiro de 2012

Para ler: A Mecânica do Coração



O mistério que cerca essa pequena cantora me deixa em polvorosa. Faço uma coleção de imagens mentais de seus longos cílios, de suas covinhas, de seu nariz perfeito e das ondulações de seus lábios. Cuido de sua lembrança como quem cuida de uma flor delicada. Isso ocupa dias inteiros.

Só penso numa coisa, reencontrá-la. Saborear de novo aquela inexprimível sensação, o mais rápido possível. Corro o risco de expelir pássaros pelo nariz? Desde que nasci, vivem consertando essa minha engenhoca. Corro o risco de morrer? Talvez, mas estou em perigo de vida se não a revir, e, na minha idade, acho isso ainda mais grave.

Compreendo melhor porque a doutora fazia tanta questão de adiar meu confronto com o mundo exterior. Antes de conhecer o gosto, a gente não pede morangos com açúcar todo dia.

A primeira coisa que me chamou a atenção nesse livro foi a capa. Ou melhor dizendo, as capas, cada uma mais bonita e poética que a outra - aliás, 'poético' me parece a palavra-chave dessa história.

Little Jack nasceu na noite mais fria do mundo - e seu pequeno coração congelou. Para mantê-lo vivo, a doutora Madeleine enxertou em seu peito um relógio cuco, por cujas engrenagens o coração voltou a bater. Abandonado pela mãe, Little Jack foi adotado pela doutora, cercado por uma família adotiva um tanto desregulada - um ex-policial com coluna de metal que toca como uma flauta em dias de vento e duas prostitutas que se divertem em fazê-lo aprender palavras novas.

Em cima da colina vive Little Jack junto com Madeleine, e esse é todo o seu mundo até o dia em que completa dez anos e a doutora o leva à cidade pela primeira vez - quando ele encontra a pequena cantora, Miss Acácia, que faria seu coração disparar como um relógio cuco e degringolar todas as suas engrenagens.

'Amar é perigoso para você e seu pequeno coração', diz a doutora Madeleine. Mas isso não impede que Little Jack vá atrás da cantora - mesmo que seja necessário deixar para trás rastros de sangue e atravessar metade do mundo.

A história é a um tempo surreal, bizarra e incrivelmente delicada. Não lembro onde foi que vi compararem esse livro com a obra do Tim Burton (aliás, o livro deve virar animação, dirigida por Luc Besson), mas há uma certa razão. Em alguns momentos, Lttle Jack me fez lembrar a ingenuidade sonhadora de Edward Mãos-de-Tesoura.

Mas Jack não é simplesmente ingênuo - curiosamente (e talvez um tanto contraditoriamente) ele tem uma sensualidade forte, uma paixão e um ardor que não se importam se seu coração pode ou não suportá-los. Ele é intenso e se dá por inteiro - e não espera menos dos outros.

Creio que possa chamar a história de conto de fadas - os requisitos estão todos lá: o sublime, o encanto, a ilusão, a dor. Poema em prosa, onde arrancar seu coração para entregá-lo à pessoa amada não é simples metáfora, A Mecânica do Coração é um livro diferente, inesquecível e muito verdadeiro.





A Coruja


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3 comentários:

  1. Já tinha visto uma dessas capas em uma livraria, achei interessante mas não procurei mais informações. Lendo seu post, me interessei pelo livro. Parece muito bacana.

    Bjos, Flávia.
    @flaviacalil

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  2. Lu que capas mais lindas... uauuuuu comprava facinho só pelas capas hehhehehehe... mas ai tem a tua resenha acompanhando e já virou uma necessidade, já está na lista :)
    estrelinhas coloridas...

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  3. Vou confessar que já (quase) entrou na lista apenas pela capa, mas depois da resenha,do trechinho,e esse video parece que me conquistou!
    Vai pra lista!

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