31 de janeiro de 2021

A Vertigem das Listas: Dez Incríveis Criaturas Folclóricas


Lulu: Janeiro vai chegando ao fim e o ano já nos rendeu grandes emoções - e emoções boas, embora ainda haja muito com o que se preocupar.

Enfim… fim de mês também significa, cá no blog, dia de vertigem das listas! E abro o ano com um tema para passear pelas lendas e mitos do mundo: Dez Incríveis Criaturas Folclóricas. Gosto de viajar por esse tipo de história, é um tema que me fascina, então… vamos a eles!

1. Começo, claro, pelo folclore brasileiro, que é rico em criaturas fascinantes. Há uma, em particular, que sempre me chamou a atenção - seja pela injustiça envolvida em sua transformação, seja pela imagem em si, bastante assustadora. Falo da mula-sem-cabeça, que, segundo contam por aí, são mulheres amaldiçoadas por terem se relacionado com padres. Nas noites de quinta para sexta-feira, elas se transformam numa mula com labaredas no lugar da cabeça, atacando todos que encontram pelo caminho, até o cantar do galo pela manhã. O curioso é que o padre envolvido na conversa não parece sofrer qualquer tipo de revés… Folcloristas acreditam que a lenda seja de origem ibérica, tendo viajado com portugueses e espanhóis para a América Latina.

2. Ainda no nosso folclore, outra criatura que acho muito interessante é o Saci. Pequeno e possuindo apenas uma perna, ele usa um gorro vermelho e está sempre fumando um cachimbo. É uma criatura travessa, que gosta de pregar peças e se locomove muitas vezes em meio a um redemoinho. Alguns o consideram um protetor da natureza, meio aparentado com o Curupira. O nosso Saci (nosso porque há variantes em outros países da América do Sul) parece ter origem numa amálgama de lendas indígenas e africanas.

3. Outro folclore que me fascina particularmente é o escocês - ou talvez eu deva ser mais ampla e abarcar o Reino Unido de uma maneira geral, que tem várias criaturas e lendas curiosas. Enfim, entre vários outros de que eu poderia falar, meu particular favorito é o Kelpie (que usei inclusive como inspiração para um conto, publicado na antologia Valquírias), derivado das lendas celtas. O kelpie normalmente assume a aparência de um cavalo magnífico e atrai suas vítimas para as margens dos lagos em que vive, onde então as afoga. De uma maneira geral, pelo que entendo da Escócia, você nunca deve chegar muito perto da água, porque, além do kelpie, há uma miríade de criaturas nas profundezas das águas sempre prontas a te levar para o fundo.

4. A despeito do que disse acima, nem tudo o que está nas águas está pronto para te devorar. O que me faz lembrar dos selkies, que, no mar, são focas e, em terra, assumem formas humanas extremamente belas. Os selkies vêm para terra buscando um parceiro e, embora se apaixonem por humanos, sempre sentem o chamado do mar e acabam retornando para ele, deixando corações partidos em seu caminho. Pelo menos, essa é a visão mais romântica da história… (tem algo do nosso boto nela, não?) Em outras versões, são humanos que roubam a pele de foca de selkies incautos, forçando-os a permanecer em terra contra sua vontade. Para quem lê em inglês e gosta desse tipo de história, recomendo que faça uma visita no site do Visit Scotland, que inclusive tem alguns dos contos narrados em áudio.

5. Eu aparentemente tenho uma predileção por criaturas aquáticas, porque fecho minha lista com talvez o mais famoso dos monstros mitológicos marinhos: o kraken. De origem nórdica, o kraken é normalmente descrito como algo semelhante a um polvo ou lula de proporções descomunais, capazes de afundar navios inteiros. Ele é bastante popular em várias mídias; possível encontrá-lo tanto em Vinte Mil Léguas Submarinas quanto em Piratas do Caribe. Não sei explicar minha fascinação com o kraken - talvez algo ligado aos mitos lovecraftianos? - mas eu não poderia deixar de citá-lo aqui.


Ísis: Minha vez!

6. Vou começar com Tengus, criaturas do folclore japonês que têm suas origens fora das terras nipônicas em textos budistas, até onde eu saiba. Tengus têm personalidades diversas e várias habilidades também, inclusive de se transformarem no que quiserem. Em geral, são guerreiros habilidosos que podem voar devido às suas asas negras e exercem controle sobre elementos da natureza, especialmente o vento. Eles são extremamente protetores de seus territórios, normalmente montanhas ou florestas, e são especialmente habilidosos em criar tempestades. Originalmente nutrem ódio pelos monges budistas e existiam apenas para desvirtuá-los, atormentá-los, raptá-los ou até mesmo matá-los. Hoje, porém, podem ser espíritos tão maléficos quanto benéficos, e alguns até amam e protegem os monges budistas também. Dada à aparência humana com a qual se manifestam entre os humanos, muitas vezes, costumam ser presenteados com aparência humanoide, de pele vermelha, asas grandes e negras, um nariz comprido e, no caso dos mais fortes, costumam carregar um báculo semelhante aos dos monges budistas.

Ao dar uma rápida pesquisada sobre o assunto, descobri esse relançamento com os budistas e de repente entendo um pouco melhor a relação dos personagens principais de Tactics, um dos meus mangás preferidos (e esse é mais outro que foi descontinuado). Os personagens centrais são justamente um jovem com poderes espirituais (xintoístas) e um tengu que tem um báculo budista.

7. Hanuman. Esse esperto macaco é da mitologia hindu. Depois que viajei para a Índia, Nepal e sul da Indonésia, acabei aprendendo bastante sobre a cultura e sobre algumas histórias. Claro, não sei muito, vez que há inúmeras lendas na longa e antiga história do Hinduísmo, mas algumas são populares o bastante para se repetirem em diferentes lugares. Uma das mais populares é a história de Rama e Sati, Ramayana, e conta a trajetória de Rama, avatar (reencarnação) do deus da criação Vishnu, casado nessa rodada da vida com Sita, considerada uma das encarnações de Lakshmi, deusa da fortuna nos dois sentidos da palavra. Enquanto Rama saíra para caçar lutar, Sita foi raptada pelo demônio Ravana e mantida prisioneira por muito tempo. Rama a buscou por muito tempo, mas foi só com a ajuda de seu fiel seguidor, o macaco Hanuman, que conseguiu achá-la e salvá-la. Hanuman, pelo que tenho entendido, era uma espécie de fiel escudeiro do rei/deus Rama, e os templos deste muitas vezes esboçam também a figura de Hanuman, além de proibirem que os macacos que se aventurem no templo sejam machucados.

8. Medusa. Fala sério, quem nunca ouviu falar da Medusa. A essas alturas, essa lenda já foi usada e abusada em tantas mídias que às vezes fica até difícil lembrar qual a história original. Nessas horas, invoco a Rainha, porque ela adora explicar mitologias gregas (e celtas e nórdicas):


Lulu: A Medusa é uma personagem interessante e tristemente vilipendiada. Ela é a única irmã mortal das Górgonas, filha de duas divindades marítimas. Era uma bela mulher, tanto que chamou a atenção de Poseidon, que a seduziu - e uso essa palavra aqui com certa trepidação, porque há versões da história em que ele não esperou para ouvir um sim da moça, tomando-a à força num dos templos de Atena. Atena, por sua vez, ultrajada com tal ato, vingou-se em Medusa (Atena normalmente não é uma personagem muito gentil com outras mulheres…), fazendo seus belos cachos tornarem-se um ninho de cobras, deformando seu corpo e transformando seus dentes em presas de javali.

Para além de tudo isso, Medusa também recebe o poder - ou maldição, a depender do quanto ela se importava com companhia outra que a sua - de transformar quem quer que a olhasse diretamente em pedra.

A despeito de seu poder aterrador e aparência monstruosa, Medusa nunca sai em busca de problemas. Em vez disso, ela se recolhe à solidão - sendo atendida apenas por suas irmãs, imunes ao seu olhar mortal. Mas aí aparece o imbecil do Perseus, que, com a ajuda de outros deuses (incluindo… Atena), mata Medusa enquanto ela dorme - uma ação tão covarde e sem sentido que não acho justo dar a ele o título de herói -, para levar a cabeça para seu padrasto como presente de núpcias.

Medusa acabou por se transformar num símbolo feminista em tempos modernos, algo que acho bastante justo, especialmente a se considerar como ela foi retratada por vários artistas homens ao longo dos séculos. Para quem se interessa por entender essas figuras femininas da mitologia grega sob uma perspectiva menos machista, eu recomendo a leitura do excelente Pandora’s Jar, de Natalie Haynes.


Ísis: Obrigada, Vossa Majestade pela participação especial. Eu sabia que você teria certamente mais a oferecer do que eu sobre o assunto. ^^

Não sabia que ela tinha sido castigada por Atena (!!!) por algo que não teve culpa... normalmente esse espero esse tipo de vingança de Afrodite ou Hera. Vou investigar a sugestão de leitura.

9. Seguirei direto com minha próxima indicação: Papai Noel! Não creio que haja atualmente uma figura folclórica mais popular que a do bom velhinho que veste vermelho, com uma fábrica de presentes para as crianças boas do mundo inteiro e que mora no polo norte. Originalmente baseado no grego Santo Nicolas, originalmente não tinha nada a ver com o Natal, não usava vermelho e não era todo alegria, não. Por sinal, por um tempo, deixou de ser um santo e assumiu formas um pouco assustadoras para estimular as crianças a se comportarem. Somente no começo do século XIX e no Novo Mundo (EUA) que passou por novas mudanças nas mãos de poetas, e foi com o famoso poema The Night Before Christmas, oficialmente intitulado A Visit from St. Nicholas, de 1822, que Papai Noel ganhou suas oito renas. Levou, porém, mais uns 70 anos até que enfim assumisse o formato pelo qual todos conhecemos hoje, mais de um século depois. Admitidas algumas adaptações aqui e acolá, quase toda a população mundial hoje conhece essa história.

10. Yeti. Eu achei fantástico o filme Rise of the Guardians, e adorei o que fizeram com o Coelhinho da Páscoa e com o Papai Noel. Vou tentar evitar dar muitos spoilers e dizer apenas que os ajudantes do Papai Noel não são apenas os duendes; os yetis também. Mas o que são yetis? São criaturas do folclore do Nepal que supostamente vivem nas montanhas dos Himalaias, e são uma espécie de mistura entre macacos e humanos. Até hoje pegadas grandes são encontradas pelas montanhas, semelhante às do Pé-Grande nos EUA, embora na maioria das vezes sejam apenas golpes contra turistas.


Lulu: Bem, bem, temos uma lista bem respeitável esse mês, não é mesmo? E de tudo quanto é canto do mundo.

Ísis: Faltou da Oceania, mas eu não sei muito sobre a cultura de lá para oferecer pitaco. Preciso conversar mais com minha vizinha, que é de Fiji, ou com alguns formados (Timor Leste, Papa New Guinea, Marshall Islands, Fiji).

Lulu: Enfim, compartilhem conosco seus personagens folclóricos favoritos e até mês que vem, com mais um vertigem das listas!



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