11 de março de 2016
Quem Conta um Conto (Março): O Conto da Ísis || Nonsense
E eu não sei como vivo me metendo nessas situações... Mas, pensando bem, dessa vez não é algo do qual eu possa reclamar. Afinal de contas, que adolescente nunca sonhou em ter uma morena seminua no seu quarto? Não que eu seja um adolescente, afinal, só tenho quarenta e nove anos... Ainda falta muito para alcançar essa fase. Simplesmente nunca me senti na minha idade mesmo.
Normalmente eu sonho com loiras voluptuosas, de muita carne, lábios grossos e macios. E normalmente elas ainda estão vestidas, quer com algum uniforme para rolar um role-play, quer com roupas normais. Desembrulhar o pacote é metade da diversão de receber entregas em casa. Enviá-las de volta é tão divertido quanto.
Então, para responder à minha pergunta anterior, EU nunca havia sonhado com uma morena seminua, e menos ainda uma magrela. Isso, porém, não significa que eu não poderia aproveitar a situação. Deixando-a em cima da geladeira onde ela me esperava, abri a porta da mesma e entrei para a cozinha, afinal, precisava tomar um banho. Água quente encanada é uma das maravilhas das pias modernas, e minha comodidade preferida.
Mas foi quando eu voltei pela dispensa que o choque me aconteceu. Primeiro, que minha sala e meu banheiro de estar sumiram, me restando apenas um quarto com quase nada dentro. Isso não é nada surpreendente; acontece o tempo todo. E, felizmente, a morena continuava lá, embora tivesse agora sentada num colchão velho no chão. Não sei o que raios ela fazia ali na parte mais incômoda do novo cômodo, mas antes que pudesse dizer qualquer coisa a respeito, um jornal - que com certeza não estava ali antes - pegou carona no vento da janela e pousou de forma nada sucinta em minha face. E aparentemente fora impresso antes da segunda guerra mundial. Ainda bem que foi dessa época, porque pelo menos posso identificar. Depois da sétima guerra interplanetária, eu parei de contar e me confundo com as datas e fatos...
Francamente eu prefiro os cenários do segundo milênio, ou dos anos que pré-dataram a idade média. Certa vez me veio a pré-história, e, embora eu não tenha particular interesse em voltar para minha época de origem, admito que foi divertido rever alguns cenários. Mas com esse aqui, não tenho muita familiaridade. Menos ainda com sereias. É apenas a segunda vez que vejo uma, e da primeira não foi lá muito divertido. A forma como elas usam o rabo e os cabelos para fazer qualquer coisa é frustrante de ver e muito dolorido. Tanto antes quanto depois.
Porem, cliente é cliente. Mesmo que sejam de uma ex-raça dominante, exterminada há séculos atrás. Mas que esta segue o típico estereótipo de sua espécie, não tenho como negar. Grudada na TV e segurando seu longo pano branco. Não à toa dominaram a humanidade há tempos atrás, quando os humanos eram tão ligados a esse tipo de aparelho... Ou algo parecido.
Mas tem um problema. Dentre as poucas 34 línguas que domino, Mariscada não está entre elas... Não sei como descobrirei qual o caso dessa criatura...
Aliás, correção, eu sei. Servirei sopa.
Isso, isso resolverá o problema. Sopa ajuda na comunicação inter-racial.
Olhando para a morena, que parecia imóvel até então, sussurrei a refeição de escolha, e ela foi imediatamente procurar, como toda boa visita. Pelo canto do olhar, percebi que a sereia sorriu de soslaio. Acho que ela aprovou a seleção.
Sem perder mais nenhum tempo, indaguei.
- O que a traz aqui, meu escamoso senhor?
Entretanto, ela nada respondeu, e eu resolvi esperar até que a sopa fosse servida para continuar a conversa.
A morena (é melhor eu descobrir logo qual o nome dela) demorou um pouco, mas logo trouxe a sopa. Porém, parece não ter achado os pratos corretos, visto que trouxe uma bandeja com dois pratos fundos, onde presumo esteja a sopa, e um terceiro com pães e patês. Quem serve sopa em prato fundo?!
Pensando bem, talvez não tenha sobrado nenhum depois da festa de ontem à noite. Esqueci de checar para saber se precisava comprar novos...
Desculpas feitas, sopa servida e cada um no seu canto, respeitamos os cinco minutos de silêncio costumeiros. Decorridos, como todo bom grupo, jogamos os conteúdos de nossos pratos um no outro, a sereia inclusive.
A sombra de um sorriso se fez presente no rosto das duas, enquanto eu abertamente deixava transparecer o meu. Não importa que isso seja o comportamento esperado para com visitas, seguir esse costume sempre me deixa de bom humor.
Não demorou muito, porém, para que, antes mesmo que pudéssemos iniciar nossa conversa, uma voz distante se fez ecoar.
“Corram para as colinas! Corram para as colinas!”
As palavras foram vociferadas por alguém lá fora, cujo volume vocal aumentou e depois diminuiu. Já estava me aproximando da janela para saber o que estava acontecendo, e possivelmente cantar alto para quem interrompeu nosso ritual, quando um galo apareceu no parapeito, e saltou para dentro. A pobre morena quase pegou uma das garrafas abandonadas no chão para jogar no bicho, mas a coisa percebeu e ciscou o objeto de vidro para distante das mãos da moça.
Com aquele tipo de ameaça, porém, não se pode hesitar. Ciente disso, a sereia logo usou seu comprido rabo para, primeiro, derrubar o galo do abajur ao chão, e, em seguida, para praticamente enterrá-lo entre as tábuas do assoalho.
E depois pulamos os três pela única janela, na intenção de corrermos para um local seguro. Entretanto, aguardava-nos lá embaixo mais perigos, nas formas de Coruja, Elefante, Gato e Raposa. Pelo canto do olho, uma criatura branca corria pela rua em direção às montanhas.
Hoje vai ser uma noite daquelas...
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