12 de dezembro de 2014
Lá e de Volta outra Vez
Primeira observação a ser feita: o texto abaixo contém spoilers (embora eu ache isso um tanto discutível, considerando que o livro foi publicado faz mais de meio século).
Segunda observação: não, essa não é uma resenha imparcial do terceiro filme de O Hobbit, mas uma digressão emocional sobre o impacto que a obra de Tolkien – e as adaptações de Peter Jackson – tiveram sobre mim.
Terceira observação: tem sorteio ao final do texto. Pois é...
Então... fui ver O Hobbit: A Batalha dos Cinco Exércitos no cinema. Da metade para o final do filme, comecei a chorar. Chorei por causa da doença do ouro, chorei pelo Kili, chorei pelo Fili, chorei pelo Balin, chorei pelo Thorin, chorei pelo Bilbo, chorei quando a voz do Billy Boyd preencheu o cinema com a música de encerramento. Chorei, chorei, chorei tanto que saí do filme com a garganta doendo e o nariz congestionado.
Explicar tantas lágrimas não passa só por esse filme. Começa quase quinze anos atrás, quando li pela primeira vez O Senhor dos Anéis e depois saí feito dragão colecionando todos os outros volumes que apareciam. Começa com a primeira vez que sentei no cinema para ver o mundo do Condado aparecer na tela.
Eu já falei muito sobre a obra de Tolkien aqui no Coruja. É absolutamente espantosa a enormidade do universo que ele criou em seus livros. A Terra-Média tem uma história e uma mitologia; tem religião, política, geografia. Tem uma linguística – línguas diferentes para povos diferentes, cada qual com seus costumes e suas leis. Não conheço nenhum outro autor antes dele que tenha sido tão detalhista, tão cuidadoso na criação de um universo ficcional.
Tenho, claro, algumas críticas à obra. Posso entender a separação entre bem e mal que ele faz, mas estranho um pouco esse maniqueísmo. E, embora goste da forma como Tolkien trata suas figuras femininas – especialmente em O Silmarillion, mas não posso negar que elas são poucas e espalhadas. Sendo uma grande fã de Tolkien, eu gostaria de ter uma personagem mulher com quem eu pudesse me identificar. E não estou falando em questões de poder ou impacto na história da Terra-Média, mas alguém comum.
Sim, porque os grandes heróis tolkenianos – ou, pelo menos, os meus favoritos – são todos personagens relativamente comuns. Samwise e Bilbo são os nomes que mais me inspiram ternura em todo o grandioso elenco que desfila das páginas do autor e ambos são de uma enorme simplicidade – eles não planejam seus passos a longo prazo, não estão particularmente preocupados com as Grandes Questões do Bem e do Mal.
Eles agem por impulso, e são movidos pura e simplesmente por amizade. Nenhum dos dois precisava se meter nas grandes enrascadas em que se meteram – Sam podia nem ter saído do Condado, quanto mais seguido ao lado de Frodo para Mordor; Bilbo também foi muito além do que lhe contrataram para fazer, podia ter pego sua parte do ouro quando o dragão foi embora e simplesmente lavado aos mãos para a loucura de Thorin.
Quando eles decidiram permanecer ao lado dessas pessoas a quem deram sua lealdade, eles certamente não tinham idéia da situação em que terminariam. Eles sequer tinham plena consciência dos riscos a que se expunham dessa forma. Eram pessoas muito comuns, daquelas que consideraríamos acomodadas às suas vidas e seus confortos.
Eles não são mestres da espada e não matam nenhum adversário gigantesco – não fazem as vezes de Davi para um Golias Orc. Mas sua presença dá significado à história. Seus atos de coragem não são tão vistosos, eles não estão preocupados com questões de honra e nobreza.
Sua importância está em serem fiéis aos seus princípios, teimosos até. Está no suporte que eles representam para seus companheiros – não um apoio irrestrito, mas consciente e corajoso para apontar as falhas desses companheiros quando necessário.
Sam carrega Frodo em suas costas uma vez que não pode ele mesmo carregar o fardo do Um Anel. Bilbo retorna para Erebor e assume para Thorin que roubou a ‘Arkenstone’ para impedir que se faça a guerra. Sam poderia simplesmente ter pego o Anel – Frodo estava fraco demais para realmente impedi-lo; e Bilbo poderia ter ficado para trás, sob a proteção de Gandalf, em vez de retornar e revelar sua suposta traição.
(vou confessar que não me lembro no momento se o Bilbo também volta a Erebor no livro ou se ele responde a Thorin, mas estando junto de Gandalf, do lado de fora... se for uma alteração do filme, acho uma das melhores possíveis, gostei muito da cena)
Mas eles não escolhem o caminho mais fácil, de menor esforço. E é isso que os torna admiráveis. Eles não têm enormes ambições além de saber quando será a próxima parada para um lanche. Eles não têm um nome e um legado a que fazer jus ou querem competir para ver quem mata mais orcs. Mas eles são sinceros e leais.
Creio que os atores que interpretaram esses papéis no cinema fizeram-no à altura (aliás, eu não acho que exista um ator mais perfeito para o papel de um hobbit que o Martin Freeman. E eu provavelmente chorei de soluçar com Bilbo ao lado de Thorin agonizante em parte porque era rever John Watson junto a Sherlock Holmes. So much feelings...).
O roteiro, especialmente dessa segunda trilogia, deixou várias vezes a desejar – foi esticado a não mais poder e saiu bastante do espírito do original, que não era nem de longe um épico como O Senhor dos Anéis, mas um livro infantil, com um ritmo bem mais gentil.
Mas como não se emocionar quando Thorin chama seus companheiros para lutar ao seu lado ‘uma última vez’? Ou quando surgem as águias (sério, toda vez que aparecem águias nos livros do Tolkien eu fico de olhos embargados... e pulo da cadeira no cinema)? Com a despedida de Bilbo nos portões de Erebor?
Então, essa é nossa última despedida. Foi uma longa jornada, mas creio que valeu à pena.
Ao menos até que a obra de Tolkien caia em domínio público e O Silmarillion possa ser transformado em filme, mas isso, só em 2045...
Agora, vamos ao que interessa: sorteio. Comentem nesse post sobre qual foi o momento dos filmes – tanto a primeira quanto a segunda trilogia – que mais os emocionou. Vou sortear entre todo mundo que comentar um moleskine pequeno de O Hobbit. Mas não vale dizer só ‘as águias’, tem de explicar porque esse momento tocou vocês.
Vale responder até dia 30 de dezembro e farei o sorteio no último dia do ano, antes de o Coruja entrar de férias. Então, não deixem de participar! E, claro, não esqueçam de deixar email para que eu possa entrar em contato caso ganhem.
A Coruja
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Juro que estou desde o dia 12 pensando em que momento foi esse. Um só é muita maldade. Não poderia ser pelo menos um top 10? xD
ResponderExcluirBom, acho que escolho a cena em que Faramir vai em direção aos orcs, mesmo sabendo que a batalha está perdida. Além do contexto da cena já ser bem emotivo, a música, a alegoria do sumo das frutas escorrendo e tal, o que realmente me emociona nesse momento do filme é um cavalo cinzento. É um animal muito grande, muito forte, lindo. Sempre imagino que os cavalos desta cena representam o próprio Faramir, seus fantasmas em relação à obediência ao pai. Todos eles aparentam estar muito desconfortáveis, relutantes, mas obedecem, continuam dando o seu melhor. E esse cavalo cinzento tem uma expressão inigualável. As narinas dilatadas, a respiração de quem já está sem fôlego mas precisa continuar em frente, o peitoral com os músculos tensos, o olhar fixo. É nessa hora que eu entendo o que deve estar se passando na mente de Faramir. Se houvesse um Oscar animal, esse cavalo precisava ter sido indicado! Sério. Deixa Shadowfax no chinelo.
(mfernandaccastro@gmail.com)
Adorei a resposta ^^ Sei de que cena você está falando e ela me parte o coração. A música nessa cena também é maravilhosa, uma das minhas favoritas com o Pippin cantando. Putz... fiquei toda arrepiada quando chegamos nessa cena...
ExcluirQuando Elrond acompanha Arwen para casar com Aragorn. Nesta cena eu não estou olhando pra nenhum dos dois pombinhos. Eu olho para o Elrond e o quase imperceptível soluço misturado com sorriso que ele dá. Ele está, literalmente, entregando a filha nos braços de uma vida mortal. Ele SABE que ela vai morrer e ainda assim consegue compartilhar da felicidade dela nesse momento. No seu coração de pai, ele finalmente se deu conta de que a existência dela será infinita independente de quantos anos dure sua vida. E ele consegue se libertar desse peso, do medo da perda, mesmo que momentaneamente, e sorrir. Essa cena me toca muito mais do que qualquer uma entre Tauriel e Kili, hehehe.
ResponderExcluir(gabrielacastro.design@gmail.com)
Vou ter de assistir o filme de novo para olhar para o Elrond nessa cena, porque confesso que não prestei atenção nesse detalhe... mas impecável observação, de fato, sobre os sentimentos de pai do Elrond. "a existência dela será infinita independente de quantos anos dure sua vida" - que coisa genial, adorei!
ExcluirHmm, faz muito, muito tempo mesmo que eu assisti à trilogia original. Os filmes de The Hobbit podem não ter sido tão bons, mas me emocionaram do mesmo jeito - até porque é o meu livro favorito do Tolkien. E me colocaram num clima de Terra-Média muito amor <3 tô morrendo de vontade de ver a versão estendida de SdA.
ResponderExcluirEnfim, acho que podia falar de várias cenas emocionantes (pra mim) dos três filmes, mas acho que a mais importante foi a primeira de Uma Jornada Inesperada. Ver o Bilbo escrevendo no livro vermelho sobre os Hobbits, com as imagens lindíssimas do Condado e aquela música (AH MEU DEUS, AQUELA MÚSICA <3 <3) fez meu coração derreter muito. Pelo o que eu vi por aí, foi considerada uma cena bem "meh" para os espectadores casuais, mas acho que para os fãs foi uma visão muito especial. E, claro, começar com a simplíssima mas brilhante frase inicial de "Num buraco no chão vivia um hobbit" foi o toque final para o meu silencioso ataque de fangirl no cinema ^_^
(lizziebelacqua@gmail.com)
Concordo, concordo, concordo! Aliás, é espetacular o trabalho que se teve com a trilha sonora de todos os filmes, não é verdade? É para, realmente emocionar todo mundo!
ExcluirCom certeza o momento mais memorável foi quando fui ver O Retorno do Rei, não inteiramente por bons motivos.
ResponderExcluirChego à sala do cinema com os amigos, ansioso pelo início do filme... e ele não vem. Por UMA HORA esperamos o filme, sem nenhuma resposta dos funcionários do cinema, apenas com as luzes de emergência ligadas. Sim, havia faltado energia no shopping inteiro, e nem sinal dos geradores. Mas, como eu disse estava com amigos, o tempo passou rápido e a energia retornou. Começa o filme.
Eis que quando Sméagol está tirando o peixe da água, a cena trava! No centro da tela, surge um pequeno ponto laranja, que vai rapidamente crescendo e enegrecendo... O FILME QUEIMA!!! Eis que leva mais meia hora para começar o filme... E valeu cada segundo de espera!
Lembro também de correr para ler os livros antes do lançamento dos filmes, de ver o Balrog, os Olifantes, Laracna... Enfim, SdA é uma história única, que deixa várias (boas) lembranças, não tem como escolher só uma. =P
Então, eu tenho uma história engraçada também sobre quando fui assistir... acho que foi em As Duas Torres. Fui na estréia, início de dezembro, todo mundo saindo de férias, minha sala tava cheia de adolescente jogando pipoca um no outro... De repente, não mais que de repente, um garoto na minha frente saca da bolsa... uma flauta. E começa a tocar o tema do filme.
ExcluirPois é, música ao vivo antes de começar o filme (que, felizmente, começou na hora. e não fizeram tanta bagunça quanto eu esperava...)
Bem, eu tinha comentado antes, mas perdi o comentário. Não vou conseguir rescrever aqui nem a metade... Estava tão lindo e romântico... Bah! :( Mas vamos lá... Concordo com as cenas que você citou. Sem tirar nem pôr. Mas, para citar uma, a que mais me marcou foi a cena entre Tauriel e Kili. Eu me emocionei muito com a despedida entre esses dois amantes (platônicos). A cena toda, pela tristeza da morte de Kili emociona, claro. Mas o que ela fala em meio as lágrimas, que é mais ou menos assim, "se isso é amor, tira de mim. Eu não quero", foi algo que me tocou profundamente, porque já tive uma sensação parecida. O amor é algo maravilhoso, essencial, mas ele pode machucar (querendo ou sem querer). É como água, que em grande quantidade pode devastar. Água é essencial, mas se lembram do Tsunami? Pois bem Ehehehe. O amor é assim, às vezes quando em demasia, fere. E nem sempre é por maldade, como os acidentes meteorológicos também não o são. É a natureza, é como tem que ser (muitas vezes). Sei que a personagem Tauriel não existe no livro, ela foi inventada para o cinema, e confesso que no anterior, fiquei desgostosa com ela, mas acredito que neste terceiro filme houve a sua redenção. E entendi que em se tratando de filme, de cinema, era necessário colocar a little bit of romance.
ResponderExcluirDe um modo geral, adaptar livros para o cinema não é fácil (avalie um do porte de Tolkien). A linguagem do cinema é para as massas e a do livro nem sempre (é o caso de O Hobbit ou a trilogia O Senhor dos Anéis). Então, acredito que devemos dar um desconto, apesar de todas as falhas e esquecidas de roteiro. No geral, acredito que Peter Jackson soube honrar os livros e criou ótimas diversões. Acredito até que ele despertou em muita gente novos leitores de Tolkien. E isso já é uma proeza.
(mariavivianemenezes@gmail.com)
Não nego que chorei nessa parte (eu sempre choro, sou muito chorona...). Seu comentário me lembrou um trecho que o Gaiman escreveu na série Sandman que é bem isso - o quanto dói amar.
ExcluirAinda acho um tanto esquisito a idéia de elfo se apaixonando por anão, mas no filme o Kili não tem muitas características típicas da raça (ele está mais para um homem baixinho).
Creio que a inspiração para esse romance tenha vindo mais das uniões entre as casas dos homens e elfos. Como o Jackson não vai poder colocar a mão na história de Lúthien e Beren, decidiu experimentar com Tauriel e Kili. Não ficou de todo ruim no final (embora deva concordar que fiquei meio de cabelo em pé quando vi esse desenvolvimento no segundo filme... aqui eu já estava esperando por isso, então não achei tão estranho quanto antes... tive tempo para me acostumar com a idéia.)
Difícil lembrar claramente da trilogia original. Tenho pouca memória pra relembrar coisas com detalhes as coisas. Mas tenho muita lembrança dos sentimentos que me marcaram durante esta e aquela cena. No primeiro filme, toda a sequências de quando eles entram em Moria me dá um frisson. Não sinto aquela sensação de adrenalina em nenhuma das outras sequências de ação dos outros.
ResponderExcluirNo segundo filme, vira e mexe fico emocionada com os discurso do Sam no fim do filme. (Que não me lembro se existe no livro, que aliás é meu preferido quando eu li, mas não aconteceu o mesmo com o primeiro)
Apesar ficar irritada, como todos, com todas as firulas que PJ fez no Hobbit. Eu gostei bastante do primeiro filme, e de várias coisas do terceiro. O segundo poderia ter deixado só a parte do Smaug. (Que BC aliás fez magistralmente como tudo que ele faz. E a parte do dragão que foi meio brochante no livro pra mim, tomou outra perspectiva no filme pra mim.)
Existiram pequenos detalhes nesta trilogia que me emocionaram. Como o diretor amalgamou o começo do filme com uma referência ao Senhor dos Anéis. A amizade de Bilbo e Thorin. A união entre aquela companhia de anões. (A cena da chegada deles na casa do Bilbo e assaltando a dispensa dele eu veria eternamente) E por fim, a morte do Thorin que me fez chorar que nem um bebê.
Acabei descrevendo vários momentos... Mas acho que pra mim o que ficou marcado mesmo foram os pequenos detalhes e as sensações que as acompanham.
É bastante compreensível, de fato... difícil escolher um único momento - a gente meio que cresceu com esses filmes, não é verdade? Faz mais de dez anos que temos acompanhado esse épico desenrolar das histórias da Terra Média...
ExcluirPutz, também chorei feito bebê quando Thorin morre... e adorei o dragão do BC...
Mas acho que meu momento favorito ainda é o Sam falando com Frodo sobre o poder das histórias. Caramba, que discurso lindo... tem no livro, mas ele é um pouco diferente lá - acho que a fala dele no filme é um pouco mais emocional que a do livro.