1 de agosto de 2010

Desafio Literário 2010 - Agosto: Um romance policial



Dinkins trouxe para Nix uma cerveja com um colarinho cremoso e Nix nos relatou o terrível assassinato da noite anterior em Morton Street, uma viela que saía de Union Square, cercada de cada lado por casas de prostitutas.

- Uma francesa chamada Marie Gar. - disse Nix. - O assassino a estrangulou e retalhou toda. As tripas se esparramaram como as de uma truta.

- Parece que existe um sujeito que detesta as mulheres mais do que eu. - disse Bierce.

- Estes lunáticos que odeiam vaginas - disse Nix. - A mãe dele fugiu com um jogador quando ele era pequeno. Ou uma puta lhe passou gonorréia no Little Casino e ele só pensa em trinchar uma mulher.

- Alguma pista? - quis saber Bierce.

Nix tinha um rosto em forma de machado e um bigode negro que o envolvia pela metade. Fez um sinal com a cabeça, lambendo a espuma do bigode.

- Ás de espadas. - disse. - O criminoso deixou uma carta de baralho sobre a vítima.


Eu estava com esse livro na estante desde outubro ou novembro do ano passado - não lembro agora com certeza, mas sei que o comprei na Bienal. A princípio, tinha pego esse título porque estava escrevendo Ases (o que me lembra que tenho de terminar o capítulo 07...) - e a menção a cartas de baralho me chamou a atenção. Mas aí eu acabei perdendo o livro de vista no meio da pilha diária de processos no escritório e dos muitos livros se avolumando em casa na fila.

O Desafio Literário foi uma excelente desculpa para finalmente tirá-lo da estante...

Sinopse do livro:

O mistério de Ambrose Bierce e a Dama de Espadas começa quando um esfaqueador - com toques de Jack O Estripador - mata e estripa prostitutas, seus corpos são jogados nas emaranhadas ruas perto da Union Square de São Francisco, deixando uma carta de baralho, em cada uma delas numa assustadora ordem crescente - primeiro o ás de espadas, depois o dois, do mesmo naipe e assim por diante.

Ambrose Bierce imediatamente coloca a culpa no seu grande inimigo, a Ferrovia Pacífico Sul. Enquanto isso, o ingênuo repórter Tom Redmond acompanha obstinadamente o caso, descobrindo conspiração e corrupção a cada momento. Para Bierce é uma nova oportunidade de continuar sua guerra pessoal contra a rodovia e contra a politicagem corrupta de São Francisco. Para o jovem Redmond, que teme pela segurança de uma mulher em particular, é um grande caso de mistério que pode alavancar sua carreira.


Sinceramente? Eu não tenho muita certeza do que fazer desse livro. Por um lado, eu adorei a figura do Bierce - não importa quão misógino o cara seja, obcecado com a corrupção dos magnatas da ferrovia South Pacific. A reconstituição história também foi primorosa, capaz de evocar, realmente, São Francisco pelos fins do século XIX.

Por outro lado, a narrativa às vezes escapa do eixo; muitas tramas paralelas que podem ou não convergir numa enorme teia de conspirações. Acho que eu talvez tivesse gostado mais do livro se ele fosse narrado pelo Bierce e não por Tom, com sua fixação pelo Amelie Brittain e sua história com o Cavalheiro (nome pelo qual o rapaz chama seu pai).

Da forma como terminou, a revelação de quem estava por trás dos assassinatos foi meio que anticlimática. Todos os personagens envolvidos tinham um passado sórdido; nenhum deles ali merecia ser absolvido. A certeza - ainda que certa - de Bierce sobre o envolvimento da South Pacific por vezes beira uma teimosia infantil. Por um momento, temos a impressão de que ele só pegou o assassino por ser teimoso e não por qualquer tipo de dedução lógica.

E, sério, quem é que vai fumar ópio para poder clarear a mente e descobrir a verdade?

No final das contas, eu não estava lendo a história para descobrir quem era o assassino, mas sim para ver como terminaria a cruzada de Bierce contra o monopólio e a corrupção institucionalizada do estado da Califórnia.

Aliás, é importante observar que o grande personagem do livro não é um personagem original inventado pelo autor, mas uma figura história real. Ambrose Bierce é considerado um dos grandes autores americanos, tendo sido contemporâneo de Mark Twain.

Seu apelido era "Bitter Bierce" e ele foi ferozmente perseguido por conta de suas invectivas contra os grandes do poder nos jornais pelos quais passou. Até hoje, sua biografia é envolta em mistério - em 1913 ele deixou Washington para fazer uma viagem pelos antigos campos de batalha da Guerra Civil (na qual lutou) e simplesmente desapareceu. Ninguém sabe o que foi feito dele, além do fato de que ele cruzou a fronteira com o México. E depois disso, nada, zero, puf!

Uma das coisas que eu mais gostei no livro foram os aforismas com que cada capítulo é aberto, retirados do Dicionário do Diabo, obra escrita originalmente por Bierce. Chamou-se tanto a atenção que fui atrás de outrs livros do autor e pretendo agora destrinchar os originais - uma vez que estão todos disponíveis para domínio público na página do Project Gutenberg.

HOMICÍDIO, s.
O assassinato de um ser humano por outro. Existem quatro tipos de homicídio: doloso, escusável, justificado e louvável, mas não faz grande diferença para a pessoa assassinada se morrer de um tipo ou de outro - a classificação é para a vantagem dos advogados.

AMOR, s.
Insanidade temporária curável pelo casamento ou afastando o paciente das influências sob as quais ele incorreu no distúrbio.

TRABALHO, s.
Um dos processos pelos quais A adquire propriedade para B.

HABEAS CORPUS
Mandado através do qual um homem pode ser tirado da cadeia quando confinado pelo crime errado.


Nota: 3
(de 1 a 5, sendo: 1 – Péssimo; 2 – Ruim; 3 – Regular; 4 – Bom; 5 – Excelente)

Ficha Bibliográfica

Título: Ambrose Bierce e a Dama de Espadas
Autor: Oakley Hall
Editora: Record
Ano: 2001
Tradutor: Roberto Muggiati
Número de páginas: 318


A Coruja


____________________________________

 

16 comentários:

  1. Eu gostei da sinopse do livro, mas como vc falou q nao gostou mto, fikei meio na duvida se coloco ou não ele na lista das minhas próximas leituras...

    ResponderExcluir
  2. eu conhecia alguns aforismos do cara, tinha copiado num caderninho da adolescência. mas esse livro parece que usa o nome dele em vão :oD

    ResponderExcluir
  3. Pois é... no final das contas, o livro não empolga tanto pela história, mas pela possibilidade de conhecer outro autor. O ponto positivo desse livro foi me deixar curiosa para ler os próprios contos do Bierce...

    ResponderExcluir
  4. Hmmmmm gostei da sinopse mas fiquei até na dúvida sobre ler ou não... você parece que não gostou muito não rs

    Mas, pra ser sincera, se tivesse visto esse livro, só pela capa já teria ficado maluca pra ler hehehehe

    Bjos

    ResponderExcluir
  5. Hum...como já disseram os outros, tmabém fiquei na dúvida sobre ler ou não o livro.

    Mas o que eu gostei mesmo foi a sua resenha- muito boa!

    ResponderExcluir
  6. Estou meio por fora de romances policiais, mas daria uma chance para esse livro, sim. Obrigada pela dica.

    Beijocas

    ResponderExcluir
  7. Resenha sincera. Talvez um dia quem sabe eu leia.
    Obrigada.
    Bjos

    ResponderExcluir
  8. Gostei da resenha e achei excelente a dica do Dicionário do Diabo, que não conhecia!
    Bjs

    ResponderExcluir
  9. Hum... agora fiquei na dúvida se leio ou não o livro...

    Boa resenha.

    ResponderExcluir
  10. Não conheço nem o autor e nem o livro! Parece que tem uma boa história... Gostei!!

    ResponderExcluir
  11. Eu gostei demais das suas observacoes sobre a historia do livro. Achei muito legal voce pontuar sobre a epoca em que se passa a historia. Acho que isso e' uma coisa que todo leitor deve fazer, antes de comecar a ler procurar entar em sintonia com a historia, o autor, a e'poca, etc... Parabens, deve ter sido uma boa leitura. Beijos

    ResponderExcluir
  12. Adorei seu jeito de comentar o livro, acho que é isso que vale a pena na leitura e na troca sobre ela. No final das contas e saber como bate diferente em cada um as histórias. Bacana demais!

    ResponderExcluir
  13. Achei interessante a idéia do livro, que pena que você não gostou tanto assim, sua resenha está excelente!

    ResponderExcluir
  14. Interessante, nem sequer conhecia. Gostei da sinopse do livro, mas parece que ele não agradou muito a vc. VOu pensar se um dia vou l^-elo!

    ResponderExcluir
  15. Gostei de sua crítica sobre o livro, Lulu. Estou a um tempo querendo ler este livro e como sou apaixonada por San Francisco, acho que o lerei somente pelo prazer de saber um pouco mais desta cidade.

    Um abraço e até mais!

    ResponderExcluir
  16. hum, gostei! acho que vou ler sim, estou terminando de ler uma revista

    Criação de sites

    ResponderExcluir

Sobre

Livros, viagens, filosofia de botequim e causos da carochinha: o Coruja em Teto de Zinco Quente foi criado para ser um depósito de ideias, opiniões, debates e resmungos sobre a vida, o universo e tudo o mais. Para saber mais, clique aqui.

Cadastre seu email e receba a newsletter do blog

powered by TinyLetter

facebook

Arquivo do blog