12 de maio de 2009
Notícias populares: "dançou com mulher casada e levou bala"
Esse é o segundo artigo que escrevo hoje. Tinha deixado uma enquete para que vocês escolhessem qual seria o próximo assunto para amanhã, mas como não resisti a escrever hoje mesmo e a Régis tinha deixado um voto, decidi escrever sobre o tema que ela pediu.
Todos os dias de manhã, quando vou para a faculdade, desço do ônibus na frente de uma banquinha. Ali, convivem lado a lado o Jornal do Comércio, o Diário de Pernambuco e a Folha de Pernambuco - os três principais jornais do Estado - junto com uma série de outros títulos mais populares.
Dependendo do meu espírito no dia, eu procuro primeiro o Tribuna da Plebe (ou, ao menos, creio que seja esse o título, posso estar enganada) para saber qual a última denúncia lançada contra os capitalistas maldosos e sem coração - são sempre angustiantes os momentos antes de descobrir a nova conspiração que os senhores de propriedades estão tramando pelas nossas costas.
Depois, é claro, preciso ler as manchetes sempre poéticas (bem, elas rimam...) do "Aqui", que custa apenas R$ 0,25 (estamos em tempos de crise...) e traz todas as notícias dos outros jornais resumidas.
O Aqui meio que rivaliza com a Folha pelo título de "jornal mais sangrento do Recife"; daquele tipo que, se torcermos a folha, pinga sangue. A manchete "Dançou com mulher casada e levou bala", assim como "Satanás morto em Prazeres" (não, não foi o Coisa'ruim... era um traficante da área) ou ainda "Matou e tirou onda no celular" são apenas alguns exemplos do lirismo quase de cordel deles.
Estudar o apelo do sensacionalismo - do bizarro, do cruel, do deformado - não é uma tarefa fácil. Quem nunca, passando por um acidente na estrada, desacelerou para ver o estrago, que atire a primeira pedra.
Somos voyeurs da desgraça.
Já vi gente argumentar que isso se dá apenas para a "massa", a plebe rude e ignara. Coisa do povão. Bem, para início da conversa, considerando que você seja um cidadão da República Federativa do Brasil, creio que isso o habilita e classifica como parte do povo.
Não fiz nenhuma pesquisa qualitativa ou quantitativa para obter os dados a seguir, falo apenas como observadora dos fatos do cotidiano: seja massa ou intelectual, letrado ou analfabeto (nesse caso, pedirá as notícias para outrem), uma maioria das pessoas que pára para ler essas manchetes ou carrega o jornal debaixo do braço está atrás do sensacionalismo.
E, se quiser realmente argumentar sobre isso ser coisa de classe, por favor, me diga para quem é que a Caras é editada. Quanto mais inútil e mais "figurinhas" tiver o veículo de comunicação (há dúvidas se realmente comunica alguma coisa...), mais alto vai ser o poder de compra do público.
Deve fazer umas duas ou três semanas que li um artigo sobre a crise do The New York Times, um dos principais jornais do mundo - nesse primeiro trimestre de 2009, o grupo proprietário do Times teve um prejuízo de mais de setenta milhões de dólares.
Os motivos para a crise são vários, é claro, da recessão econômica a escolhas administrativas não tão brilhantes.
O Times, contudo, não é o único nesse balaio de gato, tampouco o primeiro. O problema não é apenas econômico, ele é, sobretudo, uma evolução cultural. Bem, acho que isso depende do ponto de vista, para mim está mais para uma desevolução...
O advento da internet, a sociedade da informação, a era da modernidade líquida. O que significam estes termos, qual a importância deles no dilema que a imprensa sofre?
Uma parte da resposta está lá no começo do texto. De uma forma geral, o "homem moderno" tem substituído o papel pelo computador. Em vez de ler um periódico mais completo, contenta-se com as notícias resumidas, muitas vezes de segunda mão, em blogs e páginas independentes. Seus olhos são invariavelmente sugados para as manchetes em letras maiúsculas que noticiam o pior do pior no mundo.
Miséria gosta de companhia.
Como somos bombardeados de notícias por todos os lados e a todo tempo, temos de filtrá-las para descobrir as que guardam maior interesse para nós. Contudo, filtrá-las pode ser uma "falta de tempo", já que quando finalmente encontramos aquilo que nos é de valor, a notícia já será velha e inútil.
A questão vai bem mais fundo e é bem mais complicada do que parece a princípio. Conceitos importantes para o fundamento da democracia - como a esfera pública, que em termos muito simplistas, seria o surgimento de uma sociedade culta capaz de interferir e fiscalizar o poder, abalizada por uma imprensa séria e formadora de opiniões - estão ameaçados por essa cultura do sensacionalismo, cultura da incultura, pela manipulação de opinião, tão caras à mídia dos dias atuais.
Eis então que está formando o campo para o imbecil coletivo...
Todos os dias de manhã, quando vou para a faculdade, desço do ônibus na frente de uma banquinha. Ali, convivem lado a lado o Jornal do Comércio, o Diário de Pernambuco e a Folha de Pernambuco - os três principais jornais do Estado - junto com uma série de outros títulos mais populares.
Dependendo do meu espírito no dia, eu procuro primeiro o Tribuna da Plebe (ou, ao menos, creio que seja esse o título, posso estar enganada) para saber qual a última denúncia lançada contra os capitalistas maldosos e sem coração - são sempre angustiantes os momentos antes de descobrir a nova conspiração que os senhores de propriedades estão tramando pelas nossas costas.
Depois, é claro, preciso ler as manchetes sempre poéticas (bem, elas rimam...) do "Aqui", que custa apenas R$ 0,25 (estamos em tempos de crise...) e traz todas as notícias dos outros jornais resumidas.
O Aqui meio que rivaliza com a Folha pelo título de "jornal mais sangrento do Recife"; daquele tipo que, se torcermos a folha, pinga sangue. A manchete "Dançou com mulher casada e levou bala", assim como "Satanás morto em Prazeres" (não, não foi o Coisa'ruim... era um traficante da área) ou ainda "Matou e tirou onda no celular" são apenas alguns exemplos do lirismo quase de cordel deles.
Estudar o apelo do sensacionalismo - do bizarro, do cruel, do deformado - não é uma tarefa fácil. Quem nunca, passando por um acidente na estrada, desacelerou para ver o estrago, que atire a primeira pedra.
Somos voyeurs da desgraça.
Já vi gente argumentar que isso se dá apenas para a "massa", a plebe rude e ignara. Coisa do povão. Bem, para início da conversa, considerando que você seja um cidadão da República Federativa do Brasil, creio que isso o habilita e classifica como parte do povo.
Não fiz nenhuma pesquisa qualitativa ou quantitativa para obter os dados a seguir, falo apenas como observadora dos fatos do cotidiano: seja massa ou intelectual, letrado ou analfabeto (nesse caso, pedirá as notícias para outrem), uma maioria das pessoas que pára para ler essas manchetes ou carrega o jornal debaixo do braço está atrás do sensacionalismo.
E, se quiser realmente argumentar sobre isso ser coisa de classe, por favor, me diga para quem é que a Caras é editada. Quanto mais inútil e mais "figurinhas" tiver o veículo de comunicação (há dúvidas se realmente comunica alguma coisa...), mais alto vai ser o poder de compra do público.
Deve fazer umas duas ou três semanas que li um artigo sobre a crise do The New York Times, um dos principais jornais do mundo - nesse primeiro trimestre de 2009, o grupo proprietário do Times teve um prejuízo de mais de setenta milhões de dólares.
Os motivos para a crise são vários, é claro, da recessão econômica a escolhas administrativas não tão brilhantes.
O Times, contudo, não é o único nesse balaio de gato, tampouco o primeiro. O problema não é apenas econômico, ele é, sobretudo, uma evolução cultural. Bem, acho que isso depende do ponto de vista, para mim está mais para uma desevolução...
O advento da internet, a sociedade da informação, a era da modernidade líquida. O que significam estes termos, qual a importância deles no dilema que a imprensa sofre?
Uma parte da resposta está lá no começo do texto. De uma forma geral, o "homem moderno" tem substituído o papel pelo computador. Em vez de ler um periódico mais completo, contenta-se com as notícias resumidas, muitas vezes de segunda mão, em blogs e páginas independentes. Seus olhos são invariavelmente sugados para as manchetes em letras maiúsculas que noticiam o pior do pior no mundo.
Miséria gosta de companhia.
Como somos bombardeados de notícias por todos os lados e a todo tempo, temos de filtrá-las para descobrir as que guardam maior interesse para nós. Contudo, filtrá-las pode ser uma "falta de tempo", já que quando finalmente encontramos aquilo que nos é de valor, a notícia já será velha e inútil.
A questão vai bem mais fundo e é bem mais complicada do que parece a princípio. Conceitos importantes para o fundamento da democracia - como a esfera pública, que em termos muito simplistas, seria o surgimento de uma sociedade culta capaz de interferir e fiscalizar o poder, abalizada por uma imprensa séria e formadora de opiniões - estão ameaçados por essa cultura do sensacionalismo, cultura da incultura, pela manipulação de opinião, tão caras à mídia dos dias atuais.
Eis então que está formando o campo para o imbecil coletivo...
A Coruja
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Sobre
Livros, viagens, filosofia de botequim e causos da carochinha: o Coruja em Teto de Zinco Quente foi criado para ser um depósito de ideias, opiniões, debates e resmungos sobre a vida, o universo e tudo o mais. Para saber mais, clique aqui.
Bem, alguém já disse que excesso de informação é o mesmo que desinformação... E eu concordo.
ResponderExcluirSim, somos voyeurs da desgraça, e gostamos disso. Sentimos tédio quando tudo vai razoavelmente bem pelo mundo. E isso é péssimo...
É como um professor me disse uma vez na faculdade, "Ninguém paga para ver um filme de duas horas de felicidade e alegria ininterrupta onde tudo sempre dá certo e nada de mal acontece".
ResponderExcluirE o pior de tudo é que é verdade. Imagine só que filme chato isso seria...