18 de março de 2011
Na sua estante: todo carnaval tem seu fim
#055: Todo Carnaval tem seu Fim
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Ela só teve tempo de levantar a cabeça dos livros para enxergar o vulto do irmão abrindo a porta de casa, atravessando a sala, e sumindo pelo corredor, ao que se seguiu o barulho da porta do quarto dele batendo.
Beatriz se levantou devagar, franzindo os olhos. Por um momento, ao chegar ao quarto do irmão, hesitou junto à porta – mas então respirou fundo e juntando toda a coragem que tinha, bateu.
- Dá o fora, Bia.
Ela respirou fundo mais uma vez e fez aquilo que toda boa irmã caçula deve fazer quando seu irmão mais velho manda que ela ‘dê o fora’: ela ‘vai entrando’.
Foi necessária apenas uma passada de olhos para entender o problema.
- Ah, você está de ressaca... – ela comentou, fazendo uma careta ao sentir o cheiro do tênis largados à beirada da cama – Você devia ir tomar um banho... e colocar esse sapato para levar um vento.
- Não enche. – veio a voz abafada pelo travesseiro.
Beatriz estreitou os olhos. Havia qualquer coisa estranha na postura de André. Qualquer coisa de... vulnerável.
De onde viera aquilo? Era um pensamento deveras bizarro... Beatriz suspirou consigo mesma. Ela estava lendo romances demais...
Balançando a cabeça para livrar-se dessa linha de raciocínio, ela se sentou na beirada da cama, esperando em silêncio. Sabia que se esperasse por tempo suficiente, André acabaria falando – nem que fosse para se livrar dela.
- Você vai ficar feliz em saber disso. – André resmungou finalmente.
Beatriz sorriu. Cinco minutos. Ela era boa naquilo. Devia tentar ser irritante mais vezes. Não que ela tivesse realmente feito alguma coisa além de se sentar e esperar, mas essa, claro, não era a opinião do irmão.
- Por que eu ficaria contente? – ela perguntou, aguardando para que ele despejasse tudo sozinho. Deveria ganhar um prêmio também por sua imensa paciência e sensibilidade.
- Porque você nunca gostou da Mariana.
O sorriso desapareceu. Ela predissera que Mariana partiria o coração de seu irmão pouco mais de duas semanas antes. Gostaria que tivesse demorado um pouco mais; ou, melhor ainda, que ela tivesse errado totalmente e a outra moça ainda a surpreendesse e fizesse seu irmão feliz.
- André? – ela chamou suavemente.
- O Marcos descobriu. – ele disse, tirando a cabeça de debaixo do travesseiro – Ele viu minhas mensagens no celular dela.
A jovem mordeu os lábios. Ela não acreditava que Mariana fora suficientemente burra para guardar quaisquer mensagens de André no celular. Cara, ninguém mais lia romances ou assistia novelas hoje em dia? Poxa vida, se era para trair alguém, que ao menos fizesse o negócio direito!
Ela respirou fundo. Aquilo não estava ajudando. Precisava se concentrar no aqui, agora. Especificamente em seu irmão. E em não perder o controle e sair caçando a vaca para torcer-lhe o pescoço.
Considerando o estado de André, era bastante óbvio que o que quer que tivesse acontecido, não terminara com Mariana dizendo que ficaria com seu irmão e eles seriam felizes para sempre.
- Ela terminou com você? – Beatriz perguntou finalmente.
Bem, ‘terminar’ não era bem a palavra certa, já que... cara, esse negócio de traição era muito complicado...
O rapaz assentiu.
- Ela disse que podíamos continuar amigos.
Desta feita, Beatriz abriu e fechou a boca. Respirou fundo. Abriu e fechou a boca de novo. E então, finalmente, encontrou a voz.
- Você disse que não, não é, André?
- Por que eu diria não?
Beatriz bufou.
- Você é idiota por acaso, André? Ou masoquista? É isso? Você gosta de sofrer? Porque é a única explicação lógica para você querer continuar amigo dela depois de tudo o que essa garota aprontou contigo.
- Ela não aprontou nada comigo.
- Claro. Ela também não tem culpa de... de... Peraí, porque diabos é que ela prefere esse Marcos a você, afinal? Me explica isso, porque, sinceramente, André, eu não consigo entender porque diabos ela ficou contigo, com outro cara e depois preferiu continuar com o outro cara e te manter na rédea curta!
Ele balançou a cabeça, sentando-se na cama.
- Você está entendendo tudo errado.
- Eu estou entendendo tudo errado?! – o tom dela era indignado – Eu? Ah, que se dane! – ela se levantou, revisando os olhos – Quando você finalmente voltar a sanidade e se tocar do que essa garota tá fazendo contigo, aí você vem conversar comigo. Até lá, eu me abstenho, porque é bastante óbvio para mim que se eu continuar olhando para sua cara, serei forçada a bater sua cabeça contra a parede até que seus neurônios voltem a funcionar. “Entendendo tudo errado”! Francamente!
Ela deixou o quarto praticando marchando e resmungando consigo mesma sobre a estupidez humana e outras variantes. André suspirou, deixando-se cair de volta contra o travesseiro.
O carnaval chegara ao fim.
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A Coruja
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