4 de março de 2011
Na sua estante: conversas ao redor de um prato de biscoitos
#053: Conversas ao redor de um prato de biscoitos
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- HHUAHUAHUAHUHAUHAUAHUA...
Beatriz cruzou os braços emburrada ao perceber que, àquela altura, já havia lágrimas de riso nos olhos do irmão. Sofia continuava mastigando seu biscoito, de forma quase filosófica.
- Não é tão engraçado. – a caçula observou por fim, já perdendo a paciência com o riso continuado de André.
- Como não? – ele respondeu, a sombra do riso ainda no rosto – Não, sério, Sofia, eu a congratulo. Você largar Beatriz lá, enquanto o cara corria atrás dela tentando exorcizá-la! Isso foi fantástico!
- Da forma como eu vejo as coisas, foi ela quem me largou lá. – Sofia observou.
- Mas eu voltei! – Beatriz argumentou, voltando-se para a amiga – E quando eu voltei, você tinha ido embora. Aliás, aquele cara só conseguiu me pegar porque eu parei para te procurar.
- Se serve de algum consolo, eu quase me arrependo de ter perdido a cena.
Beatriz suspirou.
- Ainda bem que não contei a ele que o Cântico dos Cânticos é um livro erótico...
Sofia e André se encararam. O rapaz deu de ombros.
- Não olhe para mim. Eu sou só o irmão. Não posso ser culpado de nada.
A musicista suspirou.
- Tudo bem. Das aventuras que já vivi ao lado de Beatriz, essa até que foi bem tranqüila. Nada pode ser pior do que o dia em que ela decidiu que era uma boa idéia irmos caminhando do colégio para minha casa.
- Você concordou! – Beatriz defendeu-se de imediato.
André piscou os olhos.
- Mas da escola para sua casa eram mais de trinta quilômetros!
- Trinta e sete para ser exata. Quase uma maratona. – Sofia pegou mais um biscoito – Passei quase uma semana com as pernas doendo.
- Você só conhece sua cidade caminhando por ela. – Bia anunciou, num tom de voz definitivo.
- Não que houvesse muito para conhecer no específico trecho que fizemos... – Sofia deu de ombros – E ainda fomos quase assaltadas.
Foi a vez de Beatriz piscar os olhos, confusa.
- Fomos?
- Por que eu nunca ouvi essa história antes? – André questionou, intrigado, enquanto também se servia de um biscoito.
- Porque a Bia nem percebeu o que estava acontecendo, já que ia o tempo inteiro cantando e, de uma forma geral, perdida em seu próprio mundo. – Sofia parou por um instante, perdida em reminiscências – O cara não falou muito alto, só mandou passar o relógio. Eu levantei o martelo e...
- Peraí... – André a interrompeu – O que diabos você estava fazendo com um martelo?
- Feira de ciências – as duas garotas falaram ao mesmo tempo.
- A gente tinha passado a tarde arrumando nosso stand. – Sofia completou – O caso é que eu levantei o martelo, o cara murmurou qualquer coisa e atravessou a rua. Beatriz não percebeu nada e eu achei melhor também não dizer.
- Quer dizer que fomos quase assaltadas naquele dia... – Beatriz murmurou de forma pensativa.
- Do jeito que você fala, parece até que queria ser assaltada. – André meneou a cabeça – Sério, Bia, só você mesmo. – ele deu uma olhada no relógio da cozinha – Bom, garotas, a conversa está boa, é sempre bom rir às expensas da minha irmãzinha...
- Hei!
- ...mas eu tenho de ir. Compromissos urgentes.
- Você vai se encontrar com a tal Mariana? – Sofia questionou.
- Como diabos... – ele começou, surpreso.
Beatriz sorriu.
- Nós não temos segredos entre nós.
Ele balançou a cabeça.
- Por que você não se muda de uma vez, Sofia? Ou, melhor ainda, leva a Beatriz para morar com você?
- Sabe que às vezes eu me faço a mesma pergunta? Mas só às vezes, claro, na maior parte do tempo em sou bastante sã. – ela estava sorrindo – Vá logo, lover boy, ou vai acabar atrasado para seu encontro.
Beatriz engasgou com o riso. André revirou os olhos.
- Ok, tô dando o fora daqui. Bia, não ponha fogo no apartamento enquanto estou fora.
- Ele sempre diz isso quando está saindo... – a caçula suspirou, enquanto observava o irmão desaparecer porta afora, a expressão tornando-se mais séria quase que instantaneamente.
- Você está preocupada. – Sofia chamou a atenção dela – O que aconteceu agora?
- Meu irmão é um idiota.
- Ok... agora me conte uma novidade.
Com um suspiro, Beatriz se inclinou na mesa, analisando a figura florida de um dos biscoitos amanteigados que ela e a amiga tinham estado fazendo aquela tarde – mais Sofia do que ela, para ser sincera, mas o que importava era a intenção.
- André pode não ser sempre um exemplo a se seguir... e eu não concordo com o que ele está fazendo. Mas o grande problema... o grande problema não é nem o quão errada é toda essa situação. – ela encarou Sofia – Ele realmente gosta da Mariana. Realmente gosta, entende.
- Entendo. – Sofia deu um meio sorriso triste para a amiga.
Todos eles se conheciam desde que eram crianças. André às vezes brincava dizendo que Sofia e Beatriz se conheciam quase que desde o útero. Tinham crescido mais ou menos todos juntos.
Ela também estava preocupada com André.
- Eu não confio nela. Em toda essa situação, ela é a mais errada, entende. – Bia respirou fundo – Se ela realmente gostasse do André como ele gosta dela, ela teria terminado com o outro desde o começo. Mas, não, em vez disso, ela mantém os dois dançando ao redor dela, como... como marionetes. Eu já a vi com meu irmão, Sofia, e ele... ele praticamente orbita ao redor dela, enquanto ela só faz provocá-lo... Ela vai partir o coração dele e não há nada que eu possa fazer.
- Bem, você estará aqui quando isso acontecer. Estará aqui para ele.
- Para recolher os cacos, você quer dizer... – Bia retrucou – Não que ele vá deixar que eu me aproxime para fazê-lo, mas...
- Preocupe-se com o futuro quando ele estiver aqui, Beatriz. – Sofia a interrompeu, pousando uma mão sobre a da outra – Eu concordo com você, mas, ao menos por hora, não há nada que possamos fazer.
- Eu detesto isso.
- Bem-vinda ao mundo real. – Sofia retorquiu – Mais um biscoito?
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A Coruja
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