#047: Parte da mobília
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Tem dias que a gente quer apenas se sentar e fazer nada – dias em que você fica olhando para o nada e deixa o tempo passar, como se não fizesse parte de nada, parte da paisagem, um simples observador.

De uma forma geral, Luís sabia que era um expectador e não um protagonista. O melhor amigo, nunca o mocinho da história. Era o seu papel na vida, um com o qual estava razoavelmente acostumado.

Claro que as coisas pioravam dez vezes ali na fazenda dos avôs, onde o tempo parecia não ter passado, as noites eram noites de verdade, estreladas, e a televisão – seu único contato com o exterior, porque é claro que nem celular pegava no meio do nada – funcionava quando bem entendia.

Ali, ele não era sequer um observador, porque, sendo o caçula da família e pouco ou nada entendo das conversas dos mais velhos, que falavam sobre pessoas que tinham conhecido em tempos passados; pessoas que ele não conhecia e provavelmente nem teria chance de conhecer, Luís estava tão deslocado quanto um viajante do tempo.

Ali, na fazenda dos avôs, ele era parte da mobília. Ou talvez, algo abaixo da mobília. O que poderia vir abaixo do grau de importância da mobília?

O rapaz suspirou, fechando a revista de palavras cruzadas que tinha sido sua companhia constante durante as férias. No dia seguinte, eles estariam voltando para casa; no dia seguinte, ele estaria de volta à civilização.

E, enquanto o dia seguinte não chegava... ele daria um cochilo.


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